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Descrição de chapéu The New York Times

Cantores fazem show no meio do esgoto de Nova York

Nova-iorquinos se reúnem às margens do East River para ouvir músicos que aproveitam a acústica única de um túnel de drenagem

A cantora e pianista Yuli BeÕeri fecha uma apresentação ao pôr do sol no Queens - NYT

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Dodai Stewart

Larry Desgaines estava sentado sobre uma folha de papelão colocada em cima de uma pedra úmida perto da boca de uma grande tubulação de esgoto de Queens num fim de tarde de sexta-feira recente. "É um privilégio estar aqui", ele disse, sem ironia.

Faltava pouco para o pôr do sol, e Larry fazia parte de um público de cerca de 50 pessoas também sentadas sobre pedras em frente às águas do Emissário de Esgoto Combinado #BB 029 de Nova York, no ponto onde o rio canalizado subterrâneo Sunswick Creek desemboca no East River.

Dois homens estavam sentados numa canoa na água –que, surpreendentemente, não fedia a esgoto. A proa do barco apontava para a terra. Com o sol se pondo atrás da ilha Roosevelt, outro homem sentado ao lado da entrada do túnel bateu com um bastão em um cano metálico. O som produzido foi de um sino tocando.

O condutor da canoa, usando chapéu tirolês, cantou à tirolesa: "Willkommen!" (bem-vindos). Ele esticou a sílaba final, e sua voz foi amplificada e ecoou no túnel. Quando a canção terminou, a canoa desapareceu dentro da tubulação de esgoto, deixando apenas os ecos para trás.

Foi a noite final do concerto Drain Bramage, um evento improvável organizado pelo músico e compositor Stefan Zeniuk com os designers de experiências N.D. Austin e Danielle Isadora Butler.

Austin e Butler são co-fundadores do Tideland Institute, que incentiva os moradores de Nova York a encarar a cidade como uma cidade marítima e repensar como vários de seus cursos d’água podem ser usados.

"A água em Nova York virou uma espécie de pano de fundo da cidade, nada mais", falou Butler. "Sendo que na realidade é porquê e o como a cidade foi feita –e como ela ainda funciona."

Ao longo dos anos, Austin já se envolveu em várias experiências aquosas efêmeras na cidade: um bar do tipo "speakeasy" montado num contêiner de navio, uma mesa de trabalho extremamente socialmente distanciada boiando numa balsa no East River, um bar dentro de uma caixa d’água.

Como seus eventos anteriores, o concerto no esgoto teve um aspecto sigiloso, de caça ao tesouro. Às 19h30, o público se reuniu na ponta de um hipermercado, ao lado de um cartaz dizendo "atenção, clientes". As instruções chegaram em mensagens de texto:

Siga a cerca ao lado do rio. A calçada se afasta do rio quando chega a uma fileira de arbustos na outra ponta do estacionamento. Continue a seguir a cerca discretamente, atrás das árvores. Há um buraco pequeno na cerca. Trate os pescadores com respeito.

As pessoas foram chegando uma a uma à margem pedregosa do East River e do riacho subterrâneo convertido em local de escoamento de um esgoto. O concerto foi programado para acontecer na maré baixa, permitindo a entrada e saída de barcos do túnel.

Quando os ecos do canto à tirolesa foram sumindo, houve uma pausa. Depois veio o som prateado de um trompete e o gemido baixo de uma tuba. Uma balsa larga foi emergindo lentamente do esgoto, levando a bordo quatro instrumentistas de metais –Zeniuk tocava saxofone— que tocaram enquanto Austin e um colega mantinham o barco estável.

A música para trompa, intitulada "Low Tide" (maré baixa), foi composta especialmente para aquela noite por Zeniuk. Notas que soavam como as de uma sirene de aviso de navio reverberaram loucamente, abafando o barulho do estacionamento adjacente.

Para os músicos, boa parte da atração do evento foi a acústica imersiva incrível produzida pelo túnel de esgoto. É natureza, é mágico, é química", comentou a instrumentista e cantora Yuli Be’eri. "É alquimia. É tudo isso junto."

Depois da música para trompa, Be’eri emergiu do esgoto numa balsa tocando um piano (cujas pernas tinham sido retiradas) e cantando uma canção "em parte improvisada, em parte poesia hebraica, em parte sons aleatórios".

Naquela noite o céu estava claro, mas o concerto foi apresentado por quatro noites, em uma das quais Nova York estava envolta em fumaça de incêndios florestais vinda do Canadá.

"Na quarta a gente nem tinha certeza se iria fazer o show, porque o céu inteiro estava vermelho-sangue", comentou Zeniuk. Para ele, o fato de ficar lutando contra a fumaça para sentar-se ao lado de uma tubulação de esgoto "criou uma situação tipo comunitária. Foi muito belo."

A pequena enseada estava pacífica. Pássaros piavam. Ferryboats que passavam ao lado criavam ondas ocasionais que batiam suavemente nas pedras. As árvores farfalhavam na brisa e, quando as pessoas andavam, produzia-se um som de folhas secas e gravetos sendo esmagados.

A noite caiu, escureceu, e o show terminou com outro canto à tirolesa. "Auf Wiedersehen", cantou o homem de chapéu tirolês, Sylvester Schneider, de seu poleiro na canoa.

Butler agradeceu a todos por apoiar a "cultura underground alternativa" de Nova York. "Ela está viva!"

Como se tivessem escolhido o momento exato, dois morcegos apareceram perto da abertura do esgoto e saíram voando na noite.

"Hoje em dia, com as redes sociais, tudo parece mais cool do que é na realidade", comentou Be’eri mais tarde. "Aqui foi o contrário. Fazer isso foi mais cool do que qualquer foto que você vai ver."

Tradução de Clara Allain