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Transplante de rim: 'Por que doei meu órgão para um estranho'

Azeem Ahmad, que doou rim para um estranho, diz que não se arrepende

Azeem Ahmad doou em 2019 um rim para alguém que ele não conhecia - BBC Brasil/ NHSBT

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Em 2019, Azeem Ahmad, que tem 35 anos e mora na cidade de Newcastle, no Reino Unido, doou um rim para alguém que ele não conhecia.

Ahmad conta que, para ele, virar doador foi uma escolha fácil, mas pensada com muito cuidado. Ele não conhece quem recebeu seu rim —mas sabe que ajudou a melhorar a vida dessa pessoa. Vale destacar que uma pessoa saudável pode levar uma vida normal com apenas um rim funcionando.

Desde o início da pandemia de Covid-19, os transplantes renais e as doações altruístas caíram consideravelmente, revelam alguns registros nacionais e internacionais.

O sistema público de transplantes da Inglaterra está, inclusive, pedindo às pessoas que pensem se estão dispostas a se tornarem doadoras. Eles também recomendam compartilhar essa decisão com familiares e amigos.

No Brasil, de acordo com o Registro Brasileiro de Transplantes, um total de 26.230 brasileiros estavam na lista de espera para receber um novo rim em junho de 2021. Desses, 305 são crianças.

A pandemia levou a uma redução significativa no número de transplantes desse tipo que foram realizados. Em 2019, 6.295 transplantes de rim aconteceram no Brasil. Em 2020, o primeiro ano da crise sanitária, essa taxa caiu para 4.805 procedimentos do tipo. Um número tão baixo não era observado desde 2010.

A maioria dos órgãos que são transplantados vem de um doador morto, mas existe também a possibilidade de as pessoas doarem um rim ainda em vida. A britânica Alisha Gokani, 23, espera há anos por um transplante de rim.

Uma condição rara fez com que os órgãos dela falhassem antes que ela entrasse na adolescência. Quando Gokani tinha 19 anos, a mãe dela doou um dos rins —mas o corpo da jovem rejeitou o transplante.

Desde então, ela depende da diálise para sobreviver. Esse procedimento, feito algumas vezes na semana, exige que o paciente se conecte em uma máquina, que vai fazer o trabalho principal dos rins: filtrar o sangue e eliminar as impurezas.

Como Gokani está na faculdade, essa rotina da diálise tem se tornado cada vez mais difícil.

A britânica Alisha Gokani, de 23 anos, espera há anos por um transplante de rim - BBC Brasil/ NHSBT

"EXAUSTÃO COMPLETA"

"Tive que reorganizar completamente minha vida, e inclusive ficar algum tempo longe da universidade. Felizmente, pude voltar", relata. "Todo dia é uma luta, pois enfrento a exaustão completa por fazer um procedimento quatro vezes por semana, ao mesmo tempo em que estou fazendo um curso de tempo integral."

"Disseram-me que um doador vivo da mesma etnia que a minha seria a melhor combinação possível", continua a jovem. "Como já fiz um transplante antes, meu sistema imune criou muitos anticorpos, o que oferece desafios extras, então não posso esperar muito tempo."

"Se um doador vivo se apresentar, meus anticorpos podem ser removidos para passar por um tratamento, em que eles serão combinados com os anticorpos do doador, pouco antes de a cirurgia acontecer. Tudo pode ser planejado, para obtermos o melhor resultado possível."

"Fazer uma doação em vida é um grande pedido para qualquer pessoa e envolve uma reflexão profunda. Mas estou gentilmente pedindo a todos que leiam mais sobre doação de órgãos, conversem com suas famílias e compartilhem a decisão que tomaram."

"AJUDAR ALGUÉM"

Azeem Ahmad ficou motivado a agir depois de ler um tuíte de Neville Southall, ex-goleiro do País de Gales. Na postagem, o futebolista fazia um pedido em nome da família de uma jovem que precisava de um transplante de rim.

"Achei que deveria checar se eu poderia ser compatível, então entrei em contato com o hospital local", relatou Ahmad à BBC News. Na sequência, os médicos passaram muitas informações sobre como seria o procedimento.

"Quanto mais eu sabia, mais ficava convencido de que era a coisa correta a se fazer", diz Ahmad. "Ajudar alguém e potencialmente salvar uma vida em troca de alguns dias de desconforto parecia algo que absolutamente valeria a pena."

"Eu já era um doador de sangue e de células-tronco, então senti que essa era a coisa certa a se fazer. Eu queria ajudar."

Mesmo quando os testes revelaram que ele não seria compatível com a jovem, Ahmad decidiu prosseguir com a doação caso outro paciente compatível fosse encontrado. E foi exatamente isso que aconteceu algum tempo depois. Ahmad se lembra em detalhes do dia da operação.

"Eu sabia que ainda podia mudar de ideia na hora, mas estou muito satisfeito por ter realizado a doação. Eu não acho que isso seja para todos. Mas, para mim, foi definitivamente a coisa certa a se fazer. Minha família e meus amigos apoiaram minha decisão quando entenderam todos os motivos".

EM RECUPERAÇÃO

Ahmad demorou algumas semanas para se recuperar do procedimento cirúrgico, mas já está com a saúde restaurada. Os médicos verificam regularmente a função renal dele, que está "muito boa".

"Eu chamei o rim que ficou de Kevin, porque esqueceram ele sozinho em casa", brinca Ahmad, em referência ao personagem de Macaulay Culkin no filme de comédia "Esqueceram de Mim", de 1990.

"E ele [o rim] está indo muito bem e chegou até a crescer de tamanho e ampliar a função", descreve.

"MUITO DIFÍCIL"

Ahmad conta que recebeu um cartão e uma mensagem da pessoa que recebeu o seu rim, o que ele diz ter sido extremamente emocionante. "Isso significou muito para mim", diz. "A maioria das pessoas está preparada para dar pouco em benefício dos outros." "E a pandemia nos mostrou como isso é necessário."