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Descrição de chapéu The New York Times

Jogo de computador 'The Sims' leva seu espírito de inclusão à TV com novo reality show

Participantes disputando prêmios em dinheiro em The Sims Spark'd

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Seth Schiesel

The New York Times

Rayvon Owen já sabia que era gay quando um colega de classe o apresentou aos jogos "The Sims", em 2003, quando eles estavam na sexta série, na Virgínia. "Cresci em um lar muito conservador e religioso; minha mãe era muito severa e me vigiava demais e, quando comecei a jogar 'Sims', eu mostrava a ela uma típica família feliz, em uma casa ajardinada com cercas de madeira brancas."

"E ela dizia que gostava daquele jogo. Você tem que conseguir um emprego, administrar seu dinheiro, casar e ter filhos", completa. Owen riu. Um dos jogos mais populares do planeta., "The Sims" há duas décadas oferece aos jovens um laboratório social para explorar as alegrias, terrores e mistérios da vida adulta pela primeira vez.

Embora algumas áreas dos videogames sejam caracterizadas por uma toxicidade pueril, "The Sims" está há muito tempo na vanguarda da inclusão, simplesmente por oferecer escolhas aos seus jogadores. "Por isso eu tinha um bairro no jogo para quando minha mãe estava vendo", afirma Owen.

"Mas ela não sabia que eu também tinha o bairro onde era casado com um homem, e dividia a casa com um, –ou vários– homens, e fazia coisas promíscuas completamente impensáveis no mundo real em que eu vivia, já que cresci frequentando a igreja e tudo isso".

Owen, 29, é cantor e agora vive em Los Angeles, e não discutia sua sexualidade publicamente até 2016, quando foi finalista do programa American Idol. Recentemente, ele estreou como apresentador de um reality show diferente, The Sims Spark’d, baseado no jogo.

Os quatro episódios da primeira temporada foram exibidos no dia 17 de julho no canal TBS, como parte do bloco de programação ELeague, do grupo Turner. No dia 20, eles estrearam no canal de YouTube BuzzFeed Multiplayer.

Embora competições de esportes eletrônicos costumem ser transmitidas para o mundo todo há muito tempo, o novo reality show será o primeiro baseado em um jogo eletrônico. E como reality show, ele se apega estreitamente à fórmula comprovada de sucessos como Project Runway, com 12 participantes participando de vários desafios durante o programa –"crie duas famílias rivais de bairros diferentes", por exemplo –em busca de um prêmio de US$ 100 mil.

Para selecionar os participantes –dez mulheres, dois homens–, a série recorreu a criadores de conteúdo relacionado a "The Sims" com número significativo de seguidores no YouTube e Twitch. Embora existam alguns conflitos menores, The Sims Spark’d não destaca muito os dramas interpessoais. As câmeras não seguem os participantes de volta aos seus hotéis e o clima geral do programa é mais sadio que sacana.

O reality show prefere se concentrar em permitir que os participantes contem histórias, no jogo, que reflitam suas vidas e experiências. Questões de gênero, sexualidade, raça e classe têm grande peso. Nesse sentido, a verdadeira narrativa emerge do significado pessoal que o jogo parece ter para os participantes e para os jurados, quase todas as pessoas na casa dos 20 anos.

"O tema do programa e do jogo é que você pode ser quem é e jogar da maneira que melhor o represente", disse Tayla Parx, 26, cantora e compositora que é uma das juradas. "Para mim, como uma mulher bissexual negra, o jogo sempre pareceu muito valioso."

"Ao permitir brincar com as dinâmicas de família e as dinâmicas sexuais, o jogo nos deixa definir as fronteiras de cada pessoa de uma maneira realmente bonita. O pior que pode acontecer é que você precise reconstruir o personagem se não gostar dele", ela disse.

Will Wright, que já era um criador aclamado de jogos por conta do popular e influente "SimCity", concebeu "The Sims" depois que sua família teve sua casa destruída por um incêndio em Oakland, Califórnia, em 1991. No estágio de planejamento, o projeto se chamava simplesmente "Dollhouse" [casa de bonecas].

Nos anos transcorridos desde que o jogo foi lançado, em 2000, a premissa básica continuou sendo a mesma: dar aos jogadores a capacidade de criar uma versão fantasiosa de uma vida familiar real. Os jogadores criam diversos personagens, conhecidos como "Sims", e constroem casas, e depois direcionam as vidas dos personagens como preferirem.

"Tudo girava em torno de como fazer o mundo do jogo refletir o mundo em que vivemos", disse Lyndsay Pearson, a diretora-geral de The Sims na Electronic Arts, a companhia de videogames que distribui o jogo. "O mundo em que vivemos muda e as histórias que nossos jogadores querem contar mudam, e aceitamos isso. Na série, é isso que queremos que transpareça."

A série de jogos permite que os jogadores mantenham relacionamentos com pessoas do mesmo sexo desde que eles surgiram, mas só permitiu que casais se casassem em "Sims 3", lançado em 2009. Quatro anos atrás, a Electronic Arts atualizou o jogo em sua nova versão, "The Sims 4", para incluir uma personalização mais flexível de opções de gênero.

Além de permitir que os jogadores criem personagens digitais com opções de gênero independentes em termos de roupagens e estrutura física, o jogo agora permite que os jogadores escolham se um personagem pode engravidar, pode engravidar outros Sims, ou nenhuma das duas coisas, independentemente de gênero.

O jogo também permite que os jogadores decidam se um determinado personagem, não importa qual seja seu gênero, vá ao banheiro em pé. Dentro do jogo, personagens individuais controlados pelo computador interagem uns com os outros sem considerar gênero ou aparência racial, até que sejam contatados por um jogador humano.

"Estava no começo do ginásio quando comecei a jogar, e agora estou chegando aos 30 anos e estamos na TV", disse Kelsey Impicciche, uma jurada do programa, mais conhecida para os fãs de "The Sims" por seus vídeos para o canal de YouTube do BuzzFeed como parte do 100 Baby Challenge, um desafio extraoficial do Sims. (O desafio depende de extremos de fertilidade que só são possíveis em um videogame.)

"Ao longo dos anos, o cerne do jogo se manteve o mesmo, mas a grande diferença é que a comunidade em si se diversificou e 'The Sims' se tornou mais inclusivo", disse Impicciche.

A série de jogos vendeu mais de 200 milhões de cópias e mais de 10 milhões de pessoas jogam "The Sims" a cada mês, de acordo com a Electronic Arts. Cerca de dois terços dos jogadores são meninas e mulheres dos 13 aos 30 anos, informou a companhia.

Craig Barry, o vice-presidente de conteúdo da Turner Sports, disse que a série era um bom encaixe para a janela de programação da TBS ELeague nas noites de sexta-feira, porque a rede está tentando expandir sua cobertura da cultura dos videogames para incluir mais que os esportes eletrônicos puros.

Embora um reality show baseado no mundo virtual de um jogo de computador possa parecer perfeito para a era da quarentena, a Electronic Arts desenvolveu e filmou a série no ano passado, em sua sede na região da baía de San Francisco.

No começo de 2019, múltiplas equipes da empresa decidiram adotar o conceito de uma competição estruturada baseada em "The Sims", em um esforço para energizar os jogadores existentes e atrair novos praticantes. A companhia optou por uma competição tradicional de reality show depois de contratar produtores estabelecidos do gênero, entre os quais Allison Tom e Richard Hall (The Amazing Race, De Férias com o Ex).

Os dois se tornaram produtores executivos de The Sims Spark’d. Embora o acordo de distribuição online com o BuzzFeed parecesse assegurado assim que Impicciche assinou como jurada, no ano passado, o acordo de TV com a Turner só surgiu em junho, disse Pearson.

Executivos da Electronic Arts disseram que o horário na TBS tinha por objetivo mostrar "The Sims" para pessoas que não conheciam o jogo e satisfazer o interesse dos jogadores veteranos, enquanto o espaço no canal de YouTube do BuzzFeed se dirige à audiência primária do jogo, jovens mulheres e adolescentes.

Muitos desenvolvedores e especialistas acreditam que as mulheres optam por jogos de simulação como "The Sims" por causa da sensação de controle que os jogadores têm sobre seus mundos virtuais, o que pode oferecer alívio diante dos desafios que as mulheres muitas vezes enfrentam em sociedades dominadas pelos homens.

Jeanette Wall, 28, é executiva de música em Brooklyn e se identifica como queer, e começou a jogar "The Sims" quando estava no ensino básico, no Oklahoma. Ela disse que esse é o único jogo eletrônico que continua a jogar regularmente, e que seu mais recente projeto no jogo é uma "comuna lésbica".

"Não tinha bonecas para brincar, e 'The Sims' era como uma casa de bonecas digital para mim, e acho que ainda é", diz. "Os elementos de controle sobre o ambiente são muito importantes –especialmente para as pessoas queer e as mulheres– porque em diversos momentos você sente que sua vida está completamente fora de seu controle, especialmente agora, dado o caos do mundo em que vivemos."

"Quando ouvi falar da série", diz ela, "foi como se pudesse enfim perceber quantas pessoas estavam jogando esse tempo todo pelas mesmas razões que eu".

Tradução de Paulo Migliacci.