Música
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Jacksons falam dos esforços para recuperar passado e evitam abordar Michael

Irmãos conversam sobre saída da Motown em 1976 e relançamento de música

Show da banda The Jacksons - Simon Plestenjak-16.mar.2019/UOL

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Ludovic Hunter-Tilney

Em 1981, um entrevistador do semanário musical britânico "New Musical Express" foi orientado a evitar dois tópicos ao falar com os irmãos Jackson. Um era The Osmonds. "Os meninos estão fartos de ouvir perguntas" sobre o grupo pop familiar rival, disseram ao jornalista.

O outro tema tabu era astrologia, algo sobre o qual os Jacksons se recusavam a falar, aparentemente por terem sido criados como Testemunhas de Jeová. Quarenta anos mais tarde, a proibição de falar dos ídolos teens concorrentes e de signos astrológicos já foi revogada, mas seu lugar foi tomado por um tópico mais pesado.

Durante videochamadas com três dos quatro membros sobreviventes dos Jacksons, perguntas sobre a fama problemática de Michael Jackson, seu irmão, foram rejeitadas por um agente publicitário que acompanhou a conversa.

O tema da "farsa", como Jackie Jackson descreve as alegações de abuso infantil feitas contra Michael no documentário de 2019 “Leaving Neverland”, não está totalmente interditado. Mas não pode ser levantado sem incorrer o risco de a discussão ser encerrada de repente. A questão é um elefante no meio da sala virtual.

Meu encontro pelo Zoom com Jackie e Tito Jackson ocorre com cada um dos irmãos em um local diferente. "No céu!", diz Tito, em tom alegre quando pergunto onde ele está. Na realidade, tanto ele quanto Jackie estão em Los Angeles. O papo com Marlon acontece em uma chamada diferente pelo Zoom. “Estou em Marte!”, ele responde, não menos jovial, quando pergunto onde ele se encontra. Na realidade, ele está na Georgia.

Os três conversaram com o FT sobre uma campanha de relançamento digital. Ela envolve os seis álbuns gravados em estúdio pelos irmãos Jackson após passarem da Motown Records para a Epic Records, em 1976. Foi quando The Jackson 5 virou The Jacksons.

Também está sendo relançado um álbum gravado ao vivo em 1981. O período coberto representou um renascimento comercial e criativo do quinteto de irmãos. Também coincidiu com a fase em que Michael virou um grande astro solo.

“Gravamos vários discos muito bons para a Motown com alguns dos melhores compositores do mundo. Aqueles discos nos puseram no mapa. Mas nosso contrato com a gravadora estava terminando, e achamos que era hora de começarmos a escrever algumas de nossas próprias músicas”, diz Jackie, 69 anos. Discos de platina enquadrados e uma pintura dos Jacksons enfeitam a parede atrás dele.

Jackie, Tito e o irmão mais jovem Jermaine foram os primeiros integrantes do grupo. Michael e Marlon entraram mais tarde. Eles ficaram conhecidos como The Jackson 5 em 1965. Com o nascimento de Janet Jackson, no ano seguinte, havia nove irmãos ao todo vivendo numa casa de dois quartos em Gary, Indiana.

Os cinco irmãos cantores foram treinados para trabalhar sobre o palco por seu pai, Joseph Jackson, que impunha uma disciplina férrea. Eles fizeram seu aprendizado em shows de talento locais e festas infantis. Quando The Jackson 5 assinaram contrato com a Motown, em 1968, suas idades variavam entre 9 (Michael) e 17 (Jackie).

O fundador da Motown, Berry Gordy , os descreveu como “os últimos astros que eu desenvolveria com a mesma intensidade e o mesmo envolvimento emocional que tive com os artistas anteriores da Motown”.

Eles fizeram história por chegar ao primeiro lugar nas paradas americanas com cada um de seus primeiros quatro singles, incluindo “ABC”. Mas em meados dos anos 1970, a “Jacksonmania” já se dissipara. A fórmula da Motown estava desgastada, e o controle de Berry Gordy sobre o trabalho dos irmãos se tornara sufocante. Os antigos astros mirins enfrentavam uma idade adulta incerta.

“Algumas de nossas vozes mudaram”, recorda Tito, 67 anos. Apesar de estar na cozinha, ele está usando o chapéu-coco que é praticamente sua marca registrada. “Muita gente achou que The Jackson 5 estava basicamente acabado. Foi um momento difícil para nós, como grupo.”

Quando a Motown não os deixou levar o nome Jackson 5 para a Epic, eles passaram a chamar-se The Jacksons. Jermaine, que era casado com a filha de Gordy, deixou o grupo e foi substituído por outro irmão, Randy. “Essa é a vantagem de ter muitos irmãos”, comenta alegremente Marlon, 64. Ele está sentado diante de uma escrivaninha, usando boné de beisebol com as palavras “Study Peace” estampadas.

O primeiro álbum deles feito com a Epic, “The Jacksons”, saiu em 1976. Foi feito com os compositores e produtores Kenneth Gamble e Leon Huff, mestres criadores do chamado “som de Philly” –uma combinação sofisticada de soul e funk inspirada na Filadélfia. O estilo dinamizou a música dos irmãos Jackson. O álbum incluiu a primeira canção escrita por Michael, “Blues Away”.

Para o terceiro álbum dos irmãos com a Epic, “Destiny”, de 1978, a gravadora foi persuadida a deixar os Jacksons produzir e compor quase todas as canções. Eles o fizeram no estúdio de gravação que tinham no complexo de sua família em Los Angeles, Hayvenhurst. “É como qualquer outra coisa que se faz em qualquer ramo de negócios”, diz Tito. “Você começa como zelador e termina como presidente da empresa.”

“Destiny” é o álbum mais completo dos irmãos Jackson. Michael está ao centro do álbum, fazendo os vocais principais em quase todas as canções, incluindo os singles “Blame It on the Boogie” e “Shake Your Body (Down to the Ground)”, ensaiando os gritos e o falsete que se tornariam uma das constantes de sua carreira solo e compondo boa parte do material. Foi o primeiro álbum dos Jacksons a oficialmente atingir status de platina, ou seja, a vender mais de 1 milhão de cópias nos Estados Unidos.

Os irmãos foram restabelecidos como força importante nas paradas de sucessos. Mas Michael queria desenvolver carreira solo. “Off the Wall” foi o resultado disso em 1979, um grande sucesso seguido pelo êxito ainda mais espetacular de “Thriller” em 1982. “Michael era uma pessoa que sempre tinha ideias, que ele guardava em segredo e conduzia até o sucesso”, comenta Tito.

A sequência de “Destiny” teve que esperar. “Um disco dos Jacksons deveria ser o próximo a sair, mas em vez disso a Epic lançou ‘Thriller’”, diz Marlon. “Não gostamos muito disso. Não ficamos chateados com Michael, porque a decisão não tinha sido dele. Não gostamos muito, mas tivemos que aceitar. Uma das coisas que sempre sentimos foi que, desde que o sobrenome Jackson está em primeiro lugar, isso faz parte de nosso legado. Ele é membro da família.”

“Triumph” (1980) e “Victory” (1984) foram sucessos. Mas o grupo foi perdendo ímpeto enquanto Michael e depois Janet passaram a dominar as paradas como artistas solo. O último álbum dos Jacksons foi “2300 Jackson Street”, de 1989, um fracasso de vendas do qual Michael não fez parte.

O grupo continuou a se apresentar. Mas seu legado foi complicado pelas controvérsias em torno de Michael, que morreu em 2009. Acusações de pedofilia, não confirmadas mas persistentes, feitas contra o cantor foram reacesas pelo documentário “Leaving Neverland”, em que dois acusadores, Wade Robson e James Safechuck, detalharam os abusos dos quais teriam sido vítimas.

O documentário saiu em 2019, o cinquentenário do primeiro single de The Jackson 5 pela Motown. Jackie diz que não está preocupado com as repercussões do documentário para a música dos Jacksons. “Não me preocupei com isso. Realmente não. Porque eu sabia da verdade em relação àquela farsa toda –eu sabia da verdade, não estava preocupado com isso.”

A campanha de relançamento inclui uma remixagem da canção de 1981 “Can You Feel It” com discursos sampleados de Martin Luther King Jr. e Barack Obama. Jackie insiste que os "samples" (trechos de música) não teriam sido autorizados se o documentário tivesse alguma credibilidade. “Eles teriam dito ‘não’, sabe o que estou dizendo? Eles não acreditam naquilo, ninguém acredita.”

Nesse ponto, essa linha de perguntas é encerrada. Enquanto isso, minha tentativa de levantar a questão com Marlon em nossa conversa separada é interrompida. Fica no ar a questão de se o trabalho de The Jacksons vai conseguir desligar-se das alegações feitas contra o mais talentoso ex-integrante do grupo.

Depois de “Leaving Neverland”, algumas estações de rádio pararam de tocar as músicas solo de Michael Jackson. Ao mesmo tempo, porém, os streamings e as vendas de sua música aumentaram. Com o relançamento de seus álbuns gravados com a Epic, The Jacksons estão apostando que sua própria música também possa sobreviver à mancha na imagem da família. Se isso vai acontecer ou não é algo que está fora do alcance deles. É o público quem vai decidir.

Edições digitais de “The Jacksons”, “Goin’ Places” e “Destiny” já estão à venda. “The Jacksons Live!” saiu em 26 de março. “Triumph”, “Victory” e “2300 Jackson Street” serão relançados em abril.

Traduzido originalmente do inglês por Clara Allain.