Música

Zélia Duncan revisita o som do início da carreira em seu novo disco autoral pop

Cantora faz parceria com Moska e Zeca Baleiro em novo trabalho

Zélia Duncan - Instagram/avozdazelia
Rio de Janeiro

Nem raiva nem tristeza. O antídoto de Zélia Duncan, 54, para enfrentar “essa aspereza que a gente vem vivendo” é outro: a suavidade e a delicadeza. É nesse tom que a cantora lança o disco “Tudo é Um”, editado através de seu selo, Duncan Discos, e da gravadora Biscoito Fino. 

A ideia foi voltar um pouco ao som que fazia no início da carreira, nos anos 1990, agregando a bagagem dos 30 anos que se passaram desde então. Havia uma década que a artista não lançava um disco autoral pop. O último foi "Pelo Sabor do Gesto", de 2009. 

Neste meio tempo, ela saracoteou bastante por aí: fez tributo a Itamar Assunção em “Tudo Esclarecido” (2012), explorou sua veia teatral em “Totatiando” (2013), com músicas do compositor paulistano Luiz Tatit, gravou o disco autoral de samba “Antes do Mundo Acabar (2015)”, entre outros projetos.

Duncan não sabe dizer exatamente por que resolveu apostar nesta revisitação ao início de tudo. Para quê arrumar motivo? A coisa simplesmente aconteceu. Ela afirma que resolveu "voltar um pouco ao meu som com meu parceiro Christiaan [Oyens, compositor, multi-instrumentista e produtor]".

"Ele é muito importante na minha vida, com quem fiz os maiores sucessos da primeira fase. Violão de aço, as nossas coisas. Lembramos um pouco do nosso começo, mas com a bagagem de hoje [...] De repente, eu parei e disse: ‘Hum, que vontade!’. Tinha algumas músicas guardadas, e quis gravar com Christiaan antes de ele ir embora para Londres. Foi uma conjunção de coisas", diz a cantora.

Com 11 canções, o disco "Tudo é Um" traz, além da parceria com Oyens, nomes como Moska (“Feliz caminhar”), Chico César (“Tudo é Um”), Dani Black (“Só pra lembrar”), Dimitri (“Breve canção de sonho”), Fred Martins e Jaques Morelenbaum (“Sempre os mesmos erros”), Juliano Holanda (“O que mereço”) e Zeca Baleiro (“Me faz uma surpresa” e “Medusa”).

Para ela, a rotina de gravações em estúdio é um oásis: “É sempre um pouco alienante. Você fica muitas horas por dia. Então foi bem gostoso, no meio do bombardeio todo que tem sido o Brasil, a gente entrar ali para programar o som e para cantar. Canto ao vivo dentro do estúdio, ao mesmo tempo em que os músicos. Isso me dá um conforto, pois um reage ao que o outro está tocando na hora. O disco foi muito emotivo."

A capa do álbum é uma obra a parte. Zélia Duncan vem sem medo, madura, em um encarte que ela ressalta o quanto considera importante para a experiência musical. "A gente ainda é da geração que gosta da capa, do roteiro das músicas, de abrir o disco", pontua ela, que expõe partes do corpo nu em fragmentos.

“Ela me expõe um pouco mais, simplesmente porque me sinto muito tranquila para estar e ser quem eu sou. Muito mais do que há 30 anos. Acho que não faria uma capa dessa no início da carreira. Teria mais pudor, acharia talvez mais apelativo", diz a cantora.

"É muito diferente você se mostrar com 54 anos e você se mostrar com 30. Estou querendo dizer algo totalmente diferente. Estou querendo dizer como eu me sinto à vontade. Eu me exponho da maneira que eu quero, como eu julgo estar de acordo com o que estou dizendo dentro do disco", completa.

‘ESTE EXATO MOMENTO’

Zélia Duncan exibe uma tatuagem no pulso com os dizeres “este exato momento”, que fez após um problema de saúde. Nada mais oportuno para refletir também sobre esse ano, que já trouxe uma coleção de tragédias. Ela relembra a morte do cantor Gabriel Diniz, 28, em um acidente de avião, no dia 27 de maio.

"Que coisa estúpida, cara. Ninguém vai me convencer de que era a hora dele, um acontecimento infeliz. Que pena. Um cara cheio de vida, em um momento importante. Não temos controle de absolutamente nada. Vamos fazer as coisas agora. Esse “Feliz caminhar” também tem a ver com isso”, diz ela, referindo-se à música feita em parceria com Moska.

"Final feliz já nem importa / Mas um feliz caminhar / Que pede calma e bota a alma pra pensar”, diz a letra, que também fala em oferecer um chá para a vida quando ela esmurra a porta.

"Tatuei a frase em meio a uma fase muito crítica de saúde, que foi superada, mas que naquele momento me fez ver que a gente é finito de uma maneira realmente literal”, conta ela, que em 2017 precisou fazer uma cirurgia para tirar a tireoide. 

"Sou a saudável da turma. Corro maratona, não bebo nem fumo porque não gosta mesmo, sem nenhum julgamento. Se meus amigos fizessem uma lista de dez pessoas que tivesse algum problema, eles não me incluiriam nela. Então foi um choque para todo mundo", conta.

A cantora afirma que se sentia tão bem que desacreditava do problema e diz que esperou três meses para operar, pois queria deixar a agenda em ordem e cumprir com todos os seus compromissos já marcados. "Tive todo esse tempo para pensar e ter um contato diferente comigo. Acho legal falar para eventualmente ajudar alguém." 

Duncan afirma que "você precisa da saúde para passar pela doença". "Não significa que você não vai ficar doente. E eu sabia disso, mas acho que emocionalmente não. Eu me sentia muito segura. E de repente veio a fragilidade. Minha saúde compareceu na minha recuperação, que foi muito rápida. Fiz as pazes com minha saúde quando saquei isso."

Com vitalidade e com álbum recém-lançado, Duncan agora quer mostrá-lo para todo mundo. A estreia será em São Paulo, no Sesc Pinheiros, de 5 a 7 de julho. E como a artista não para, em breve virão mais novidades em sua carreira.

Ela voltou a cursar teatro na Casa das Artes das Laranjeiras, no Rio, e vai se formar no fim deste ano. Questionada sobre um novo trabalho como atriz, afirma que “outras coisinhas vão acontecer”. “Minha vida tem sido de arriscar muitas coisas, muitos caminhos diferentes." 

A convite do diretor teatral Moacyr Góes, a cantora participou do musical "Alegria, Alegria", em São Paulo em 2017. No ano seguinte, ela atuou na comédia "Mordidas", do argentino Gonzalo de Maria, ao lado de Ana Beatriz Nogueira e Regina Braga.