Celebridades
Descrição de chapéu The New York Times

Anne Geddes, famosa por fotos newborn, diz que bebês ajudam a manter alegria

Australiana voltou a reunir imagens de bebês durante a pandemia

Continue lendo com acesso ilimitado.
Aproveite esta oferta especial:

Oferta Exclusiva

6 meses por R$ 1,90/mês

SOMENTE ESSA SEMANA

ASSINE A FOLHA

Cancele quando quiser

Notícias no momento em que acontecem, newsletters exclusivas e mais de 200 colunas e blogs.
Apoie o jornalismo profissional.

Sarah Lyall

The New York Times

A fotógrafa Anne Geddes, 64, teve uma longa e prolífica carreira, mas seu trabalho mais conhecido talvez seja “Down in the Garden” (No Jardim, em português), um livro ilustrado de 1996 que mostrava fotos de adoráveis (ou irritantes, a depender de sua perspectiva) bebezinhos em meio a cenários hortifrutigranjeiros implausíveis, como se eles estivessem escondidos por acaso no canteiro de flores de alguém.

Você talvez já tenha visto essas imagens online, ou ilustrando canecos, cartões comemorativos ou calendários: bebezinhos acomodados em vagens de ervilhas, como se eles fossem grãos de ervilha; bebês vestidos de camundongos, dormindo dentro de botas velhas; bebês como borboletas, ouriços, repolhos, gnomos, vermes, abelhas, flores.

Houve um período em que qualquer livro novo de Geddes, definida como a mais famosa fotógrafa de bebês do planeta, vendia milhões de cópias. No pico de sua fama, ela foi entrevistada por Oprah Winfrey. Mas a internet, o Photoshop, os celulares, a transformação das contas de pais e mães no Instagram em galerias fotográficas virtuais, o dilúvio de imagens disponíveis online – tudo isso conspirou para minar o modelo de negócios que ela adotou por muito tempo.

Nos últimos anos, Geddes vem se concentrando mais em trabalhos de estúdio para grandes empresas e clientes privados, ou para organizações assistenciais como a March of Dimes. E aí chegou a pandemia.

Isolada em sua casa em Nova York com o marido, Kel, sem poder trabalhar e preocupada, Geddes se apanhou –como o resto do planeta– considerando questões mais amplas. Quando somos privados de tanta coisa, o que é importante? Como encontrar esperança em meio a tanto medo e tantas perdas? Como os artistas em pausa podem voltar sua criatividade a algo mais?

Ela e Kel tem quatro filhas adultas –todas espalhadas por diferentes continentes, hoje em dia--, e uma sugestão de uma delas conduziu ao projeto de Geddes durante a pandemia, chamado, simplesmente “Joy” [alegria]. A ideia era bem simples: pedir fotos de bebês a pais do mundo inteiro, em uma espécie de seleção virtual de elenco, para que Geddes as postasse em sua conta do Instagram. “Garanto que vou ver todas elas, e gostar de todas elas”, ela disse em uma mensagem em vídeo.

As respostas começaram a chegar. Recém-nascidos, bebês, crianças pequenas, algumas crianças um pouco mais velhas -, da França, Cazaquistão, Reino Unido, Arábia Saudita, Rússia, Irã, Polônia, Singapura, Índia, Papua Nova Guiné, e de muitos outros lugares. As fotos pareciam ser cartões postais enviados do passado, ou talvez do futuro. Pareciam vislumbres não só de alegria, mas de esperança.

“As mensagens eram sempre as mesmas”, disse Geddes em entrevista por vídeo. “Uma mãe me disse que estava me mandando seu coração”. Um dos primeiros posts mostrava um menino chamado Mason –de três anos de idade, morador do Canadá-- usando uma roupa de alien do "Toy Story". “No momento, todos os nossos corações batem juntos”, escreveu Geddes na legenda. “Alegria coletiva em todo o mundo é o que precisamos agora”.

De Monaghan, Irlanda, Sarah Bond, que tinha acabado de dar à luz um bebê, mandou uma foto de Heidi, sua filha, nascida em novembro de 2019, e só tinha alguns meses de idade quando o planeta entrou em lockdown. Bebês são como presentes; a chegada de Heidi foi especialmente preciosa para Bond, que tinha 42 anos quando a filha nasceu e vinha tentando engravidar há mais de uma década.

“Fiquei envolta em uma bolha de pura alegria, e provavelmente foi por isso que enviei a foto; jamais tinha tido um sentimento parecido”, ela disse. Incapaz de receber visitas de seus pais, de seus sogros, ou de quase qualquer outra pessoa que não sua família imediata, ela sentiu que ter a foto incluída na seleção a tornava parte do mundo mais amplo. “Eu achei que era muita generosidade dela, doar seu tempo dessa maneira”, disse Bond sobre Geddes.

Um parto durante a pandemia pode ser uma experiência solitária, e depois vem um período em que qualquer pessoa que tenha acabado de ter um filho usualmente se torna beneficiária do sistema de apoio que cerca as novas mães: visitas de amigos, que trazem presentes e encorajamento; desconhecidos que elogiam o bebê quando a família sai às ruas; avôs e avós que cuidam da criança: nada disso está disponível.

“Uma das coisas sobre as quais pensei é que há todos esses bebezinhos nascidos no ano passado e neste ano que não podem brincar com outras crianças”, disse Geddes. “Eu estava esperando o sinal do cruzamento abrir, em uma esquina, e vi uma bebê de seis ou sete meses em seu carrinho; todo mundo ao redor usava máscaras, e pensei comigo mesma que ‘ela deve achar que todos os seres humanos têm essa cara’”.

Destiny Rosado, mãe de seis filhos que se transferiu de Brooklyn para Easton, na Pensilvânia quando a pandemia começou, enviou uma foto de sua filha bebê, Sophia, nascida em abril do ano passado, nos primeiros e sombrios dias do vírus.

“A parte mais difícil foi passar pelo parto com uma máscara N95. Mas isso me fez apreciar mais o trabalho das equipes de emergência que usam máscaras o tempo todo, dia e noite”, afirmou Rosado, em uma legenda que Geddes inclui em sua postagem no Instagram com a foto de Sophia. “Em determinado momento, derrubei o estande da minha sonda, e sangrei em cima de uma enfermeira, mas ela não se incomodou. Olhou bem nos meus olhos e disse que eu sairia bem daquilo”.

Pouco tempo mais tarde, Geddes incluiu Sophia em uma sessão fotográfica que realizou para a revista L’Uomo Vogue, da Itália –que incluía uma imagem de capa incomum: dois bebês nus usando gorrinhos da Vogue.

“Ela está trazendo muita pureza ao mundo em um momento de tamanha tristeza e tão pesado”, disse Rosado. “Os bebês representam vida, para mim –e esperança. É isso que ela está tentando dar a todos, um pouquinho de esperança em um momento sombrio”.

Geddes, que nasceu na Austrália, descobriu sua vocação mais ou menos por acaso. Depois de trabalhar por algum tempo no ramo de relações públicas, ela manuseou uma câmera pela primeira vez aos 25 anos de idade, e conseguiu emprego em um estúdio de fotografia de Melbourne.

Ela e Kel, executivo de televisão, se mudaram para a Nova Zelândia em 1988. Quando um editor de revista usou uma das fotos dela sobre crianças em um artigo de destaque, a carreira de Geddes decolou e ela em breve se tornou a retratista infantil de referência. Seu primeiro calendário saiu em 1992. Geddes começou a reservar um dia por mês para fotografar ideias imaginativas sobre seu tema favorito: bebês.

“Fotografar crianças pequenas é desafiador e exaustivo, mas é possível obter as imagens mais lindas, com esse trabalho”, ela disse. Naqueles dias primitivos, anteriores ao Photoshop, ela gastava centenas de milhares de dólares na criação de cenários complexos –as fantasias, as ervilhas, os cogumelos, os vasos de flores, os objetos decorativos, e muito mais– e investia tempo incontável em conseguir que os bebês fizessem o que ela queria.

Por exemplo, para uma foto de Rhys e Grant, um par de gêmeos rechonchudos que ela vestiu de repolhos, o desafio era conseguir que se aquietassem, parassem de chorar e/ou de fazer caretas (ou dormir), e aderissem ao espírito da ocasião.

“Quando você tem bebês de seis ou sete meses de idade no estúdio, começa a pensar em como conseguir que eles olhem um para o outro, em meio a tudo que está acontecendo”, disse Geddes. Ela mandou que um assistente corresse com um balão, por trás das câmeras mas de forma que os bebês vissem, e escondesse o balão no momento oportuno, quando os olhares dos gêmeos estivessem voltados um para o outro.

“A questão com os bebês é que tudo precisa girar em torno deles”, ela disse. “Você leva um recém-nascido para casa e ele se torna a grande diva do lar”.

Com a mudança muito rápida do aspecto comercial de sua profissão, Geddes teve de buscar maneiras mais criativas de ganhar dinheiro. Ela vende gravuras em edição limitada de suas fotos, online, e está desenvolvendo um app que ajudará as pessoas a organizar, armazenar e compartilhar suas fotos. Outro projeto ainda em desenvolvimento permitiria que pessoas tirem fotos de seus bebês e os encaixem em cenários clássicos de Anne Geddes –dentro de uma vagem de ervilha, por exemplo.

Mas o assunto sobre o qual realmente deseja falar é o significado da existência continuada de bebês em um momento estranho como o atual, e sobre como “a alegria se torna mais extrema quando ela corre em paralelo com o medo, a dor e o pesar”, como disse Geddes.

“O vírus não fez com que a vida parasse”, ela disse. “Os bebês servem para nos lembrar que ainda existe alegria, e de que há um futuro, e ficaremos todos bem”.