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"Não se trata de uma boba alegre", diz Juliana Paes sobre Gabriela

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"Ia pelo caminho quase saltitante. Parecia uma demente com aquele cabelo desmazelado, envolta em sujeira, os pés feridos, trapos rotos sobre o corpo. Mas Clemente a via esguia e formosa, a cabeleira solta e o rosto fino, as pernas altas e o busto levantado."

É uma Gabriela decalcada da definição de Jorge Amado no romance homônimo que a reportagem da Folha fita por entre arbustos de galhos atrofiados, cáctus de um verde vacilante e ossadas de um gado estorricado pela seca, na caatinga de Junco do Salitre, região de Juazeiro (BA), a 514 km de Salvador.

Escalada para o papel-título da nova adaptação da obra do escritor -que deve estrear na faixa das 23h da Globo até agosto-, Juliana Paes, 33, grava ali as cenas em que a sertaneja encarnada por Sônia Braga 37 anos atrás deixa seu habitat para tentar a sorte na Ilhéus dos anos 1920.

O seu destino é o eldorado litorâneo em que forças cosmopolitas começam a fragilizar o coronelismo dominante e a engendrar uma revisão de valores e códigos sociais -movimentação insuficiente, entretanto, para preparar corações e mentes locais para a chegada de Gabriela, dona de volúpia irrefreável.

Crédito: Estevam Avellar/Divulgação/TV Globo A atriz Juliana Paes em locação da novela "Gabriela" em Junco do Salitre (BA)
A atriz Juliana Paes em locação da novela "Gabriela" em Junco do Salitre (BA)

A caracterização de Juliana inclui rosto, braços e pernas (superbronzeados) cobertos de pós que reproduzem colorações e texturas de areia, lama e poeira -"kit-sujeira" também aplicado sobre as longas madeixas, o vestido de alcinha terroso decotado e a sandália rasteira de couro. Os dentes estão artificialmente amarelados.

Antes disso, a atriz teve aulas de culinária -seu repertório agora inclui acarajés, abarás, pamonhas e tapiocas-, preparação corporal ("para tentar trazer a paisagem para dentro, para o olhar") e prosódia. Até se deixa ouvir em vogais abertas e "esses" chiados bem baianos durante os primeiros minutos de entrevista.

"Essa melodia te pega de um jeito que vai ficando orgânico", justifica. "Tenho tentado me apegar ao sotaque mesmo quando não estou em cena. É muito fácil perdê-lo na hora do 'gravando!', porque ali você vai para a sua área de memória emotiva, de conforto."

ELASTICIDADE

Para entender as origens da personagem, Juliana fez laboratório no casebre sem luz, com chão de terra batida e fogão de barro de uma família sertaneja. Preparou o corpo para o gestual buliçoso de Gabriela em sessões de treinamento TRX, com fitas que ajudam a desenvolver a elasticidade -atributo que Sônia Braga exibiu com sobras (e louvor, há de consentir o leitor mais vivido) na cena da novela de 1975 em que se encarapitava no telhado de uma casa de Ilhéus para buscar uma pipa.

"Não a vejo exuberante demais. Como é uma retirante que abandona o sertão porque está passando por necessidade? Tem o corpo seco, magro, enxuto", define a atriz, que diz ter mantido o próprio peso na vizinhança dos 58, 59 quilos.

Analistas do romance tendem a traçar um perfil híbrido da personagem, algo entre a ingenuidade infantil e a voragem de uma mulher-bicho, guiada por pulsões primais. Juliana se alinha à segunda corrente.

"Ela está conectada com sua natureza, seus desejos íntimos e vontades primitivas. Por que [alguém] tem de se casar, por que não se relacionar simplesmente por achar um moço bonito, sem apego a convenções sociais?", indaga. "Não se trata de uma boba alegre. Ela gosta de brincar, sorrir, estar em harmonia com as forças que a cercam. Mas faz isso com consciência. É uma sertaneja que não sabe nada, mas sabe muito ao mesmo tempo."

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