Saiu no NP

Santo Dias é assassinado durante piquete em São Paulo

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No início da tarde de 30 de outubro de 1979, uma terça-feira, cerca de 40 operários ligados ao Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, reuniram-se para um piquete em frente à fábrica de tubos de televisão Silvânia, no bairro de Santo Amaro (zona sul de São Paulo). Era para ser mais um dia de luta na tentativa de convencer os trabalhadores daquela fábrica a aderirem aos movimentos grevistas, que começavam a fervilhar na Grande São Paulo naquele ano, por melhores salários e condições de trabalho. Mas um tiro disparado por um policial militar acabou com a vida do metalúrgico e líder comunitário Santo Dias da Silva, de 37 anos, que representava os piqueteiros naquele dia.

Crédito: 31.out.1979/Folha Imagem
Cortejo fúnebre do metalúrgico Santo Dias da Silva toma as ruas do centro da capital paulista em 1979

Relatos de testemunhas publicados no "Notícias Populares" na época contam que, antes do assassinato, cerca de dez policiais, divididos em duas viaturas do Tático Móvel da Polícia Militar, chegaram gritando e atirando para o alto a fim de desmantelar o piquete. Mas os operários não se intimidaram, e, em meio à correria, Dias tentou resgatar um companheiro que havia sido agarrado pelos policiais. Nesse momento foi atingido no abdômen pelo soldado Herculano Leonel, de 37 anos. O metalúrgico morreu por volta das 14h, a caminho do Pronto Socorro de Santo Amaro.

Santo Dias nasceu em Terra Roxa, no interior de São Paulo, onde trabalhava como lavrador. Veio para capital no início dos anos 60, com a família, na tentativa de uma vida mais digna. Aqui se tornou líder comunitário do bairro Vila Remo, onde morava com a esposa Ana Dias e um casal de filhos. Além de representante comunitário do bairro, era membro da Pastoral Operária de São Paulo, ligada à Confederação Nacional dos Bispos do Brasil. Pela atuação, tornou-se fiel amigo do então arcebispo da Arquidiocese de São Paulo, dom Paulo Evaristo Arns.

Sua morte causou grande comoção no país. Lideranças políticas como Ulisses Guimarães e o iniciante Fernando Henrique Cardoso, ambos do MDB - partido de oposição ao regime militar -, entre outros, se manifestaram contra o brutal assassinato do operário. Então líder sindical do ABC paulista, Luis Inácio Lula da Silva também esteve na capital à disposição da família e dos companheiros de Dias.


No dia seguinte, depois de ser liberado pelo Instituto Médico Legal, o corpo do operário foi levado para a igreja da Consolação, no centro de São Paulo, onde foi velado no início da manhã. Por volta das 11h, conforme informado pelo "NP" em 1º de novembro, um cortejo com cerca de 30 mil pessoas acompanhou o caixão do sindicalista até a Catedral da Sé, onde foi celebrada uma missa de corpo presente, ministrada por dom Paulo Evaristo Arns. Dali o corpo seguiu de carro para o cemitério do Campo Grande, na zona sul da capital, onde foi sepultado.

Crédito: 31.out.1979/Folhapress
Companheiros carregam caixão com o corpo de Santos Dias, em cortejo da rua da Consolação até a catedral da Sé

Em 8 de abril de 1982, o policial militar Herculano Leonel, autor do disparo que matou Santo Dias, foi condenado a seis anos de prisão pelo Conselho de Sentença da Primeira Auditoria Militar do Estado de São Paulo. O "Notícias Populares" do dia 9 de abril destacou a sentença do soldado, que foi anunciada após mais de 20 horas do início do julgamento. Contudo, em 16 de dezembro de 1983, pouco mais de um ano após a condenação, o Tribunal de Justiça Militar do Estado de São Paulo decretou a absolvição do PM. Devido à decisão unânime dos quatro juízes que votaram contra a condenação de Herculano, o caso foi encerrado, não cabendo mais recurso.

"Foi mais uma grande decepção. Mas não será o fim da minha luta por um mundo mais justo", disse ao "NP" a viúva do operário, Ana Dias, que completou: "Parar de lutar em defesa dos oprimidos seria fazer exatamente o que querem os que nos oprimem. Seria concordar com os que assassinaram o meu marido".

No evento pelos 25 anos da morte de Santo Dias, realizado em outubro de 2004, na Câmara Municipal de São Paulo, Luciana Dias da Silva, filha do operário, lançou o livro "Santo Dias - Quando o Passado Se Transforma em História", que conta a trajetória de luta do pai. Baseado em documentos e depoimentos, teve como coautoras a jornalista Jô Azevedo e a fotógrafa Nair Benedicto.

Santo Dias, além de ter virado nome de praça na Vila Remo, onde morava, foi também homenageado por dom Paulo Evaristo Arns, quando este criou em 1982 o Centro Santo Dias de Direitos Humanos, para a defesa e a promoção da dignidade humana.

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