Saiu no NP

Roberta Close passa a perna em Miss Brasil

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Os anos 80 não foram os mesmos com o surgimento do jovem modelo carioca Luiz Roberto Gambine Moreira, transexual cujo codinome Roberta Close, ganhou fama no Brasil com sua simpatia e beleza exuberante.

De travesti "pé de chinelo" a um dos maiores símbolos sexuais do país, Roberta Close foi manchete em inúmeras edições do "Notícias Populares", principalmente em 1984, quando despontou de vez para a grande mídia.

Em maio daquele ano, Roberta Close havia quebrado barreiras ao ser o primeiro transexual a posar nu para a Playboy, num ensaio que vendeu 200 mil exemplares em três dias, um feito até então inédito na história da publicação. Houve rumores de que Paulo Maluf —que era deputado pelo PDS e candidato a presidente da República— pedira a um de seus assessores que lhe comprasse um exemplar da revista, pois estava interessado numa matéria sobre presidenciáveis, onde seu nome fora citado. Mas a tentativa foi em vão, a edição havia se esgotado das bancas.

Crédito: Tarcísio Motta - 3.jun.1984/Folhapress
Ao lado Silvio Santos, Roberta Close foi jurada no concurso Miss Brasil 84, no Palácio das Convenções do Anhembi

O "Notícias Populares", por sua vez, não poupou elogios a mais nova celebridade da década. Na reportagem "Mulher Mais Bonita do Brasil é Homem", veiculada em 31 de maio de 1984, o "NP" enalteceu em letras e números a nova beldade do país: "Roberta Close, 22, é uma morena de estonteantes 1,80 m de altura, olhos negros, curvas provocantes (93 cm de busto e 103 de quadris ) e uma malícia ingênua que não deixa dúvidas, merecia ter nascido mulher".

Já na reportagem do jornalista Júlio Saraiva, impressa no "NP" em 3 de junho de 84, Roberta Close fez confissões exclusivas ao jornal, entre elas a primeira experiência sexual, aos 14, com um vizinho. Além de revelar "sentir cólicas, como se fosse ficar menstruada", contou ainda do orgulho em ter ganho o título Miss Brasil Gay, em 1981, ano em que começou a carreira de modelo. Quando perguntada por Saraiva se também fazia papel de homem na cama, fez "cara feia". Mas respondeu: "Não. Não sinto nada como homem. Meu comportamento na cama é de mulher. E só".

Na cerimônia para a escolha da Miss Brasil 84, realizada em 3 de junho no Palácio das Convenções do Anhembi, Close - que fazia parte do júri - causou grande delírio na plateia de mais de 3.000 pessoas que participavam da festa. Na reportagem "Roberta Close Passa a Perna em Miss Brasil 84", assinada pela jornalista Sonia Abrão e veiculada no "NP" no dia seguinte ao evento, o jornal conta o clima de euforia em que o transexual fora recebido pelo público, com "milhares de assovios maliciosos". Silvio Santos, apresentador do concurso, reconhecera que a modelo "passava a perna" em muitas das candidatas presentes. Quando subiu no palco a pedido do apresentador, Close foi agraciada com mais do que o dobro dos aplausos destinados à vencedora do concurso, a Miss São Paulo Ana Elisa Cruz, de 18 anos.

Em outra ocasião, no Aeroporto Internacional de Brasília, de onde a modelo seguiria com o irmão e empresário Roberto Gambine para um compromisso na cidade de Goiânia (GO), sua presença no aeroporto culminou no atraso de pelo menos dois voos. Tudo por conta do estrondoso assédio de centenas de pessoas que desejavam vê-la de perto. A reportagem do "NP" para o episódio, intitulada "Roberta Close fecha aeroporto de Brasília", foi publicada em 5 de julho de 1984. Durante as duas horas em que aguardou o embarque, Close (sempre sorrindo) distribuiu cerca de cem autógrafos, além de beijos.


Em "Tropa de choque salva vida de Roberta Close", de 26 de julho, o "NP" noticiou mais um imbróglio causado de forma despretensiosa pela modelo, no aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre (RS). "Quando desembarcou, "Miss" Close vestia um conjunto preto de couro e um blusão que deixava, sedutoramente, seus ombros à mostra. Enquanto posava para fotografias, fazendo ar de gata, uma multidão calculada em duas mil pessoas tentou agarrá-la. A zoeira só teve fim quando chegou um pelotão de choque da Polícia Militar para socorrê-la. Outros 15 'robustos e machões' agentes de segurança também ajudaram no isolamento do travesti", relatou o "NP".

"Miss Close" foi destaque também na Colômbia, onde, segundo o "NP", provocou grande barulho no Congresso daquele país. Na reunião de votação para a vice-presidência colombiana, realizada no início de setembro de 84, um dos legisladores causou surpresa na Casa ao dar o seu voto para Roberta Close. Com uma sonora gargalhada, o secretário responsável pela apuração, chegou a anunciar o misterioso voto. No entanto, o "NP" não conseguiu informações sobre o deputado.

No meio artístico, até o eterno machão do cinema nacional, o ator e diretor Jece Valadão (1930-2006), se rendera ao encanto do transexual. Com ele, Roberta Close teve sua primeira experiência no teatro ao atuar na peça "Uma Vez por Semana", da inglesa Muriel Resnik (1915-1995). No espetáculo, Close fazia o papel da amante de um milionário casado, interpretado por Valadão. Outros detalhes de sua estreia no teatro foram relatados na edição do "NP" de 21 de setembro de 1986, quando a peça entrou em cartaz. Com Erasmo Carlos, protagonizou o clipe "Dá um close nela", música que, segundo o compositor, não foi uma homenagem a ela, e sim coincidência.

Crédito: Paula Giolito - 5.mar.2011 /Folhapress
Roberta Close, durante baile no Copacabana Palace, no Rio, em março de 2011

A vontade fervorosa de ser uma mulher por completa levou Roberta Close à Inglaterra, em 89, para uma cirurgia de redesignação sexual. A declaração da modelo sobre a operação causou grande polêmica nos meios de comunicação. No "NP" de 17 de março de 1990, Telma Lipp, também modelo transexual, e principal desafeto de "Miss Close" desde o início do anos 80, deu seu parecer sobre a cirurgia: "...jamais faria esse tipo de operação. Só vejo vantagem como estética. E o problema do prazer? Como ficaria com o órgão eliminado? Ela não sente prazer!". Na semana anterior, Roberta havia dado o seu recado sobre novo corpo, afirmando: "Sinto mais prazer agora do que sentia antes da operação".

O "Notícias Populares" também acompanhou a luta da modelo, que, desde 1990, tentava mudar o seu nome de homem para o de mulher na justiça brasileira. Inúmeras vezes negado, o pedido só foi aceito em 2005, pela juíza Leise Rodrigues, da 9ª Vara de Família do Rio.

Casada há cerca de 20 anos com suíço Roland Granacher, Close vive hoje em Zurique, na Suíça, onde sempre foi reconhecida como mulher. Mas frequentemente vem ao Brasil para ver amigos e familiares.

Mesmo carregando o estigma da sexualidade, Roberta Close conseguiu se esquivar do preconceito.

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