Factoides

HUMOR: Lei que não serve à sociedade, serve aos lumbagos afligentes

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Existem só dois tipos de pessoas no mundo: as que acham que o homem é uma besta e as que têm certeza.


As do primeiro tipo acreditam que o "cerumano" nasce bom e é estragado pela sociedade. As do segundo tipo acham que o "cerumano" nasce mau e é civilizado pela sociedade. No primeiro grupo estão Jean-Jacques Rosseau e o Surfista Prateado. No segundo, Thomas Hobbes e o Batman.


Os dois grupos, no entanto, admitem a necessidade de leis, seja para disciplinar o indivíduo (Batman) ou regular a sociedade (Surfista Prateado).


A primeira legislação do mundo é o Código de Hamurábi, formulado em 1700 a.C. O tal Hamurábi era rei da Babilônia e decidiu criar um conjunto de leis pra organizar aquela, hmm, bem, aquela babilônia. Tipo assim:


"Se um escravo levanta a mão contra o seu senhor no sábado, ele será apedrejado na segunda-feira, mas seu dia de trabalho não será abonado."


"Se a liteira de um homem bloqueia a garagem de outro, os carregadores serão guinchados e o dono da liteira perderá a carteira de habilitação até que sacrifique um boi branco no templo de Baal."


"Se um homem sevicia o camelo de outro homem, a vítima tem o direito de seviciar a cabra ou a mulher do ofensor, mas não a mula ou a vaca."

Crédito: Edson Aran

Você acha engraçado porque não é mulher. Ou babilônico. O povo do Hamurábi achava o código "da hora". Lei existe em função da sociedade de um determinado período.


Por isso é muito esquisito quando um juiz se recusa a ouvir o "clamor da sociedade". Olhando daqui de baixo, parece que o legislador está só dando um jeitinho de embargar a infringência.


Jogar a culpa na sociedade não é coisa do Batman e nem do Surfista Prateado, mas de Conan, o Bárbaro: "E saiba, ó príncipe, que eu roubei, matei e esfolei... mal aí, mas a culpa é da sociedade."


Ou então: "E saiba, ó Meritíssimo, que eu desviei dinheiro público, mas a culpa é da sociedade que não entende que esse é o meio para atingir um fim. Não vou dizer qual é o fim porque detesto spoiler."


Ou ainda: "Aí, ô, sociedade fica sussa. Cê tá #xatiada porque não entende as minúcias da lei, valeu? Passar bem."


Então, já que a culpa é sempre da sociedade, deixo aqui uma modesta proposta: que tal dissolver a sociedade? Vamos viver num mundo pré-Hamurábi, gente! Todo mundo volta pro mato e fica pulando de galho em galho, catando piolho, desenhando em paredes e tentando inventar a roda. Será que a gente consegue aprovar isso em regime de "urgência urgentíssima" antes que joguem na mesa outro lumbago afligente?


EDSON ARAN é autor de cinco livros. O mais recente, "Delacroix Escapa das Chamas" (Editora Record), é uma sátira futurista passada na São Paulo de 2068. Foi diretor das revistas "Playboy", "Sexy" e redator-chefe da "Vip". É um tuiteiro compulsivo e sua conta é @EdsonAran.

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