Nova versão de "Saramandaia" combina humor e estranhamento
E não é que o "Pavão Mysteriozo" deu as caras? A clássica canção de Ednardo, tema de abertura da versão original de "Saramandaia" (1976), tocou logo na primeira cena do "remake" que estreou nesta segunda-feira (24) na Globo.
Mas não apareceu mais. A nova sequência de créditos usa uma faixa instrumental com toques de jazz, que em nada faz lembrar a antiga trilha sonora.
Esta dicotomia musical serve de resumo para toda a adaptação que Ricardo Linhares está fazendo em cima da obra de Dias Gomes: o ponto de partida é o mesmo, mas o de chegada é completamente diferente.
Eu tinha 15 anos quando a primeira "Saramandaia" foi ao ar, e assisti a quase todos os capítulos. Por isto, não consigo ver a nova versão sem compará-la o tempo todo com a que se incrustou na minha cabeça de adolescente.
Novos atores fazendo personagens conhecidos sempre trazem algum estranhamento. Sérgio Guizé, com sua cara de criança crescida, empresta a João Gibão uma doçura que não existia na interpretação de Juca de Oliveira. Já Chandelly Braz, como a (literalmente) fogosa Marcina, não tem o glamour brejeiro que Sonia Braga dava ao papel.
A maior novidade que o novo autor traz à história é a disputa entre dois clãs rivais, os Rosado e os Vilar, apimentada pelo romance abafado entre seus respectivos líderes, Zico (José Mayer) e Vitória (Lília Cabral). Os dois atores já formaram casais inúmeras vezes, e têm uma química evidente.
Igual acerto são as referências a outras novelas "regionais" da Globo. Uma placa de estrada aponta os caminhos para Sucupira, Tubiacanga e Greenville, cenários imaginários de outras tramas da emissora. Expressões como "desmorrer" e "saramandalhas" remetem ao colorido vocabulário de Odorico Paraguaçu, o protagonista de "O Bem Amado" --também de Dias Gomes, e o maior paradigma deste gênero de novela.
Ricardo Linhares já prometeu que incluirá no texto referências às manifestações que sacodem o Brasil. Mas, por enquanto, a política está cedendo espaço ao humor. O tom adotado pelos diretores-gerais Denise Saraceni e Fabrício Mamberti é de farsa rasgada. O público parece ter aprovado: "Saramandaia" está destroçando na audiência sua concorrente mais direta, a sexta edição de "A Fazenda", na Record.
Direção de arte e efeitos especiais já mostraram que esta refação é muito melhor acabada que a "primitiva" versão de 37 anos atrás. Mas os tempos são outros.
Será que a "Saramandaia" de 2013 transcenderá o mero exercício de atualização (como Maria Adelaide Amaral conseguiu, na "Ti-Ti-Ti" de 2010), ou sempre empalidecerá na comparação com a versão original (como aconteceu com "Gabriela", "Guerra dos Sexos" e muitas outras)? Em breve saberemos.
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