Renato Kramer

'Sinto uma afinidade de alma com Roberto e Erasmo', diz Wanderléa em musical

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"Maravilhosa", de 1972, é o primeiro passo discográfico depois do colossal sucesso que foi a Jovem Guarda. "Ela dispensa apresentações, hoje no 'Som do Vinil', a querida Wanderléa!", anunciou o apresentador Charles Gavin na noite de sexta (17), em seu programa musical no Canal Brasil.

Gavin resgatou uma declaração da cantora Wanderléa ao extinto "Jornal do Brasil", em dezembro de 1975: "O segredo é não ter medo de mudar. Para mim a mudança foi dura. Pertenci a um movimento muito forte que foi a Jovem Guarda. As pessoas criam um rótulo e cobram tudo: se você fica fazendo o mesmo, reclamam. Se você muda, se assustam, pois veem que o tempo passou e elas também mudaram".

"É isso mesmo", confirmou a Ternurinha, 40 anos depois. "É muito difícil você fazer uma coisa tão marcante como foi o nosso movimento. Mas no próprio movimento eu tive a oportunidade de fazer coisas diferentes, revolucionárias para a época. Mas chega um momento que você tem vontade de estar acrescentando, né? De não ficar presa dentro de um rótulo só, porque aquilo tá dando certo, né?!", comenta Wanderléa.

E acrescenta: "A minha saída da CBS foi muito difícil pra mim, mas foi uma necessidade de mudança. Depois de tantos anos... Eu ganhei um contrato pra gravar com 9 anos de idade! Eu saí e gravei "Chuva, Suor e Cerveja" do Caetano [Veloso], bem diferente de tudo aquilo que fizera antes". Junto a Roberto e Erasmo Carlos, Wanderléa formava o trio de ouro da Jovem Guarda.

Deixando a gravadora CBS, que era quase a sua casa, Wanderléa foi recebida de braços abertos na Phonogram: "Eu queria fazer um pop brasileiro, queria gravar um rock com suingue brasileiro e tal. O pessoal assinou embaixo, mas quem dirigiu mesmo esse disco ['Maravilhosa'] dentro do estúdio foi o Nelsinho Motta", conta a rainha da Jovem Guarda.

"E foi praticamente ele [Motta] quem batizou o trabalho. Ele fez uma matéria com esse título: Wanderléa, maravilhosa! Pronto, ficou o nome do disco", conta a cantora.

"Você, Roberto e Erasmo eram as estrelas máximas da música brasileira nos anos 60, né?", observou Gavin. "Verdade", concordou a Ternurinha.

"Como é que aquela moça de 19 anos lidou com tudo isso?", quis saber o apresentador.

"Nossa, foi muito difícil mas era uma consequência, porque eu comecei a cantar muito menina em programas infantis, foi já aí que eu ganhei o contrato para gravar na CBS. Aí já era contestada dentro de casa, porque atrapalhava os estudos. Eu tinha tias médicas, então eu dizia que ia ser médica e cantora", confidenciou.

Na sua adolescência, a cantora lembra que as referências de música jovem eram Celly Campello, Sônia Delfino, Célia Vilela, Sérgio Murilo – "as raízes do rock brasileiro", adicionou Gavin.

"Mas o rock me pegou pela soltura, pela irreverência da dança, porque jogava o partner pelas costas, depois puxava por entre as pernas – aquilo pra mim era uma farra!", declarou Wanderléa.

O encontro com Roberto Carlos mereceu destaque na conversa. "Eu já tinha meu contrato com a CBS e tinha ido com a família de Minas para morar num subúrbio do Rio. E foi até essa região onde eu morava uma caravana do Luiz de Carvalho, com uma garotada que começava a fazer rock no Rio de Janeiro e junto estava o Roberto Carlos", relembra a maninha Wandeca.

"Eu fui lá pra ver, não tinha quase ninguém, tinha uns três gatos pingados pra assistir a caravana. E entrou o Roberto Carlos com um violãozinho e cantou. Eu achei legal, tinha um suingue, e fui lá atrás e nos conhecemos. E descobrimos que éramos da mesma gravadora (CBS), ele já tava fazendo o primeiro disco dele. A gravadora tava atrás de uma cantora jovem, porque a Celly Campello tava parando de cantar porque tinha se casado".

E no primeiro disco a coisa já aconteceu: Wanderléa começou a ser convidada a fazer shows fora do Rio de Janeiro (Recife, Fortaleza,...) "e a carreira engrenou a partir daí", declara a cantora que recentemente comemorou os seus 50 anos de carreira.

"A Jovem Guarda era um fenômeno de mídia tão forte, tão importante no país. que não era só musical: era comportamento, moda, contestação. Era uma coisa tão poderosa que vocês não podiam nem sair na rua! Eu não gosto muito desse termo, nem usava na época, mas vocês viraram celebridades!". comenta o apresentador.

"Não dava pra por a cara na rua. Tudo bem. Eu acho que eu sacrifiquei uma boa parte da minha vida – a minha adolescência praticamente, acho que ficou uma lacuna. Hoje eu vejo as minhas filhas aproveitando a vida, passando férias, eu digo: 'Que maravilha! Vocês fazem o que eu não fiz'. Eu estava trabalhando desde muito menina. Mas eu acho que eu sempre gostei tanto do que eu fazia!", contemporiza a cantora.

Quanto aos colegas Roberto e Erasmo, Wanderléa declara abertamente: "Embora sejamos de famílias tão distantes, mas com almas muito parecidas. Eu sinto uma grande afinidade, uma afinidade de alma com os dois".

Para encerrar, todo o repertório do disco "Maravilhosa", e do consequente show no Teatro Tereza Rachel (RJ), foi dissecado. Entre as canções, estão "Back in Bahia", de Gilberto Gil, "Vida Maneira" e "Deixa", de Hyldon, os chorinhos "Casaquinho de Tricot", de Paulo dos Santos Barbosa, além de "Uva de Caminhão", de Assis Valente, e a "Valsa Antiga", de Paulinho Tapajós e Roberto Menescal.

O disco conta ainda com a balada romântica de Rossini Pinto, "Mata-me Depressa", e a mais emblemática, segundo Gavin: "Quero Ser Uma Locomotiva", de Jorge Mautner. "Essa para mim é a música que marca uma nova Wanderléa", conclui Charles Gavin.

Renato Kramer

Natural de Porto Alegre, Renato Kramer formou-se em Estudos Sociais pela PUC/RS. Começou a fazer teatro ainda no sul. Em São Paulo, formou-se como ator na Escola de Arte Dramática (USP). Escreveu, dirigiu e atuou em diversos espetáculos teatrais. Já assinou a coluna "Antena", na "Contigo!", e fez críticas teatrais para o "Jornal da Tarde" e para a rádio Eldorado AM. Na Folha, colaborou com a "Ilustrada" antes de se tornar colunista do site "F5"

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