Renato Kramer

Reynaldo Gianecchini titubeou para aceitar papel em 'Laços de Família': 'Nem tinha TV em casa'

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"A transição de modelo para ator se deu através de uma crise", declarou o ator Reynaldo Gianecchini no episódio da série "Grandes Atores" (Viva) desta semana.

"Eu entrei numa crise e não queria mais ser só modelo. Queria trabalhar com outras coisas. Estava me incomodando trabalhar só com o corpo. Eu achava que eu tinha mais coisas dentro que não estavam sendo exploradas. Estava achando que eu estava 'emburrecendo' também, porque eu viajava demais e não tinha tempo para estudar, para me fixar num lugar. Tudo isso começou a me dar uma grande aflição. Eu entrei numa crise enorme e queria parar para estudar, para ser ator, que era a minha grande vontade desde moleque", desabafou Gianecchini.

Foi durante essa "crise" que o ator conheceu em Paris "um grande amor": a jornalista Marília Gabriela, com quem se casou. "Recebi um chacoalhão dela enorme. Ela me disse: 'Acho que você não é só isso mesmo, só modelo, você tem muita coisa dentro de você que pode trabalhar'."

Depois de voltar para o Brasil, estimulado por Gabi, Giane procurou fazer cursos e conheceu o grupo Teatro da Vertigem, com o qual conseguiu realizar "um lindo trabalho de pesquisa teatral". "Fiquei muito feliz lá dentro", afirmou. Na sequência, ele substituiu um ator no espetáculo "Cacilda", do Teatro Oficina (SP), dirigido por José Celso Martinez Corrêa.

"Estreamos num festival de teatro em Porto Alegre [RS] e foi um êxtase. Era uma peça que eu já tinha assistido e tinha ficado enlouquecido. Uma das coisas mais lindas que eu já vi até hoje. Ali eu tive a certeza de que era isso o que eu queria fazer para o resto da minha vida", declarou.

Ainda com o Teatro Oficina, fez parte do elenco de "Boca de Ouro", quando um produtor da Globo o assistiu e convidou-o para fazer um teste para uma novela, pois achava que ele tinha o perfil perfeito para um dos papéis. "Eu falei para ele: 'Olha, na verdade não tenho muito interesse em fazer televisão. Descobri a minha praia, é o teatro. Não assisto televisão, nem tenho televisão em casa'. Ele falou: 'Olha só, é a sua cara esse personagem, acho que você devia pelo menos fazer o teste'".

Então o ator quis saber algo mais sobre o personagem, quando recebeu a informação: "É para ser o par da Vera Fischer". "Oi?", exclamou Gianecchini. "Acabei indo para o Rio fazer o teste e fui viajar. Fui tirar umas férias na Austrália. Na volta, recebi o telefonema do diretor Ricardo Waddington, que me falou: 'O [autor] Manoel Carlos adorou você, ele falou que o papel é seu. Eu fiquei maluco", confessou o ator.

E titubeou em aceitar de cara o desafio: "Eu perguntei: 'Você tem certeza Ricardo? Eu nunca fiz nada na televisão'. Ele me respondeu: 'Claro que não, eu estou muito inseguro, mas o Manoel Carlos quer'. Então, realmente, eu devo muito ao Manoel Carlos a minha entrada na televisão", declarou Giane que estreou como o galã Edu, de "Laços de Família" (2000).


"Foi desumano para mim", lembrou o ator. "Eu era o meu maior crítico. Eu assistia e via que tava insuficiente, eu sabia que podia aprender e fazer muito melhor, mas era o que podia oferecer diante daquela loucura toda. Eu sofri muito, mas foi um ano intenso na minha vida e eu gosto de coisas intensas. Eu sou muito corajoso", acrescentou o ator, que apesar de ter começado "muito verde" continuou recebendo propostas de trabalho.

Sua participação em "Esperança" (2002), Giane considera um dos trabalhos mais marcantes que realizou na telinha. "Eu me orgulho demais desse trabalho. E é impossível falar dessa novela sem dizer o tanto que eu aprendi com o Luiz Fernando Carvalho, o tanto que eu virei fã desse diretor, que é um artista dos maiores".

Em 2004, o ator enfrentou o desafio de viver gêmeos em "Da Cor do Pecado". Depois foi a vez do mecânico Pascoal de "Belíssima" (2005), de Silvio de Abreu. "Eu devo muito ao Silvio. Ele foi o que mais apostou em mim em termos de acreditar no meu trabalho, de deixar eu me desenvolver em outras áreas que talvez as pessoas não conseguiam me visualizar muito. É um pai artístico pra mim", disse Gianecchini.

"Fazendo o Pascoal foi a primeira vez que eu senti o que era você cair nas graças da massa", confidenciou o ator. "Porque, até então, era muita mulherada que vinha dizer 'como você é lindo'. Nessa novela, muitos homens chegavam para mim e diziam 'cara, como eu me divirto com você', porque era o universo da borracharia, dos homens mesmo, né? Foi a primeira vez que eu senti que o meu trabalho estava sendo reconhecido, que não era mais por eu ser bonitinho, era porque eu estava fazendo as pessoas rirem", comemorou Giane.

O ator revela que sempre criou ótimos laços com seus pares românticos. Em 2007, participou de "Sete Pecados" ao lado de Giovanna Antonelli, e em 2010 fez o vilão Fred de "Passione", em parceria com Mariana Ximenes. "Eu tenho tanto respeito pela Glória (Pires) que fazer par romântico com ela [em 'Guerra dos Sexos', de 2012] para mim era difícil. Eu não tenho muito pudor com nada dessas coisas de fazer cenas de sexo, de beijar... mas com a Glória eu tive, porque tinha muito respeito, uma paixão artística por ela, que eu nem sei descrever", confidenciou o ator, cujo último trabalho na TV foi em "Em Família", do ano passado.

"Eu estreei sendo considerado o galã, o mocinho, o bonito, e tem sido assim pela minha carreira. Eu acho que as pessoas esperam que a gente seja sempre o galã, o príncipe ou sei lá o quê. Tem um preço isso tudo, tem uma cobrança muito grande, e eu senti obviamente toda essa cobrança. É um trabalho de exposição, de coragem, de você dar a cara a tapa. É um trabalho cruel de uma certa forma, e exige empenho e coragem. Então, quem não tem essa vocação, para ralar mesmo, acho que é expelido em algum momento", observou, consciente do seu ofício.

"Voltar a trabalhar depois de tudo o que eu passei foi muito especial. Depois dessa minha doença e de todo o tratamento eu vim com mais força ainda. Eu fui buscar uma força que eu mesmo não tinha a dimensão. Durante o meu tratamento, eu tive a perda do meu pai também. Então eu estava lidando com a presença da morte na minha vida e encarando a morte do meu pai. Foi um grande aprendizado. A gente, em geral, não lida com a realidade da morte. E eu acho muito importante que se tenha essa consciência da possibilidade da morte, porque quando você imagina que amanhã você pode morrer, o hoje tem que ser cheio de amor, cheio de verdade, tem que ser intenso. Eu acho que a morte não é o fim de nada".

"O que eu quero é fazer trabalhos que valham a pena, que me façam um ser humano melhor, um artista melhor, que eu possa trocar muita coisa boa com as pessoas. Ser ator é buscar a alma, a essência do ser humano", encerrou o seu depoimento Reynaldo Gianecchini, que lutou muito e fez por merecer estar entre os "Grandes Atores".

Renato Kramer

Natural de Porto Alegre, Renato Kramer formou-se em Estudos Sociais pela PUC/RS. Começou a fazer teatro ainda no sul. Em São Paulo, formou-se como ator na Escola de Arte Dramática (USP). Escreveu, dirigiu e atuou em diversos espetáculos teatrais. Já assinou a coluna "Antena", na "Contigo!", e fez críticas teatrais para o "Jornal da Tarde" e para a rádio Eldorado AM. Na Folha, colaborou com a "Ilustrada" antes de se tornar colunista do site "F5"

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