Renato Kramer

'Ele afiava facas, facões e machados', diz Paulo Betti sobre esquizofrenia do pai

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O ator Paulo Betti esteve no "Marília Gabriela Entrevista" (GNT) deste domingo (3) e falou de sua trajetória e de sua história pessoal.

Após 40 anos de carreira com novelas, minisséries, filmes e peças de teatro, Betti está em cartaz com a peça "Autobiografia Autorizada", na qual revela fatos marcantes da sua história de vida em família.

"Você viu esses 40 anos de carreira passarem?", perguntou logo de início a jornalista. "Não. Não deu pra sentir, foi tão rápido!", confessa Betti.

"Bem, tem uma coisa boa: acabou o tédio! Houve um tempo em que as coisas demoravam, hoje tudo acontece muito rápido", confirma Paulo. "Eu não me preocupo muito com isso, mas confesso que eu penso um pouco sim, no tempo, na morte, nas coisas... Sei lá, daqui uns 20 anos, numa conta boa, tchau, né?", prenuncia.

"Eu tive um professor maravilhoso, o Paulo Mendonça. Ele dizia que o homem que chega aos cinquenta anos e não pensa pelo menos uma vez por dia na morte é um perfeito idiota. E eu realmente não sou nada idiota!", descontrai o ator.

Crédito: Paula Giolito/Folhapress Retrato de Paulo Betti no Alto da Boa Vista, Rio de Janeiro
Retrato de Paulo Betti no Alto da Boa Vista, Rio de Janeiro

"Eu fiquei encantada com a riqueza e a dramaticidade de tudo o que você viveu. Você tinha consciência desse drama ou você foi um adolescente feliz?", indagou a apresentadora e também atriz.

"Eu fui um jovem feliz, uma criança feliz... Mas uma criança que tinha problemas na família". Na sequência, o ator confidencia: "Eu era um menino feliz, pois eu não podia ser revoltado, por exemplo. Não dava pra eu ter aquela fase da revolta, eu tinha que entender meus pais, tinha que tentar ajudar os meus pais".

"Seu pai era esquizofrênico?", questiona Gabi. "Meu pai tinha isso", responde o ator com cautela. "Aí ele tinha...", vai dizendo Gabi quando Paulo completa: "Crises, uma vez por ano. Meu pai foi internado muitas vezes em Franco da Rocha (hospital psiquiátrico)". "Que tipo de crises ele tinha?", quis saber Gabi.

"Meu pai foi deserdado e excluído pela família dele quando resolveu ir morar com a minha mãe. Essa rejeição talvez tenha encontrado uma brecha numa fragilidade que ele tinha e abriu aí um surto que se repetia sistematicamente no fim do ano", contou Paulo com certa dificuldade.

"Ele ficava violento?", insistiu Gabi. "Não, ele ficava místico... Ele afiava facas, facões e machados... Coisas assim. E parava de dormir. Passava um mês sem dormir até que ele se congestionava e sumia. E quando ele sumia, a gente preparava a volta dele, que era uma das coisas mais cruéis... Ter que preparar para prender ele quando ele voltasse", relembra o ator.

"Quando ele voltava, a gente ia à polícia —não tinha outra coisa, era a polícia, então tinha que imobilizar ele e prendê-lo, levar pra cadeia pra só depois então conseguir a guia e a vaga pro sanatório", complementa Paulo.

"E ele já tinha sido diagnosticado?". "Sim, eu tenho tudo guardado. Eu guardo tudo.Tenho até o atestado de óbito do meu avô", comenta o ator que usou um cachimbo —único objeto deixado pelo avô, como adereço do seu personagem Lamarca, no filme homônimo de Sérgio Rezende (1994).

"Eu tinha 12 anos de idade e tinha que ajudar a internar meu pai", relembra. "É claro, meus irmãos praticamente sem saber ler nem escrever, meus pais também... Eu fui o único que pude frequentar a escola formal. Meus irmãos fizeram alguns meses de cursos rurais. E eu era o mais novo: temporão, dez anos de diferença com o meu irmão mais próximo. Minha mãe me teve quando ela tinha 45 anos. Minha família era muito oral, então eu que tive que ir anotando tudo para contar a história".

Crédito: Eduardo Biermann/Divulgação/Revista Contigo! Ator Paulo Betti
Ator Paulo Betti

"Com meus irmãos se casando, eu virei arrimo de família —dos meus pais e minha avó. Eu sofri muito pra sair de Sorocaba (SP) e ir estudar na escola de arte dramática na capital". O ator conta que nasceu mesmo em Rafard, mas mudou-se com a família para Sorocaba aos três anos de idade.

"E como é que você foi parar na EAD? De onde vem essa vocação?", perguntou Gabi. "Vem de fundo de quintal, cirquinho, circo na praça, vem de professora que estimulava o português, vem dos padres do oratório dos padres salesianos que ajudavam a fazer um grupo de teatro —vem do grande teatro amador que havia em Sorocaba naquela época, e vem da leitura", relata Betti.

A peça "Autobiografia Autorizada" de Paulo Betti fica no Centro Cultural Correios (RJ) até 10 de maio, depois sai para turnê nacional. "Acho que eu encontrei o meu cavalo de batalha!", afirma o ator.

Renato Kramer

Natural de Porto Alegre, Renato Kramer formou-se em Estudos Sociais pela PUC/RS. Começou a fazer teatro ainda no sul. Em São Paulo, formou-se como ator na Escola de Arte Dramática (USP). Escreveu, dirigiu e atuou em diversos espetáculos teatrais. Já assinou a coluna "Antena", na "Contigo!", e fez críticas teatrais para o "Jornal da Tarde" e para a rádio Eldorado AM. Na Folha, colaborou com a "Ilustrada" antes de se tornar colunista do site "F5"

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