Renato Kramer

'Não se satisfaçam com a minha liberdade, exercitem a de vocês', sugere Ney Matogrosso

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

"Eu sou muito despojado no vestir e gosto assim", confidenciou o cantor Ney Matogrosso, entrevistado do segundo episódio do "Calada Noite" (GNT) da última quarta-feira (11).

Ao ser questionado se algumas pessoas estranham ao vê-lo tão diferente de toda a produção que sempre o caracterizou no palco, Ney afirma que sim e acrescenta: "Já me perguntaram até como é que eu fazia pra tomar banho com todos aqueles colares! Me viam com tudo aquilo no palco e imaginavam que eu vivia daquela maneira".

A apresentadora Sarah Oliveira pergunta então sobre a relação do cantor com a noite. "Pra começar a história eu tenho insônia, sempre tive", declara Ney. "Eu me lembro que eu tinha uns seis anos, a casa toda dormindo e eu perdido pela casa, zanzando. É uma coisa que não tem explicação e me acompanhou a minha vida inteira".

Em suas turnês a dificuldade para dormir acompanha o cantor. "Eu levo um rolo de fita crepe comigo para todos os hotéis, seja no Brasil ou fora, e eu tenho que lacrar os cantos das cortinas para não entrar aquela claridade que entra pelo canto", confidencia Matogrosso. "Eu tenho vergonha de pedir para fazerem isso, então eu mesmo faço", acrescenta.

O grande intérprete confessa que nunca foi muito fã de ninguém, mas que tinha por Caetano Veloso uma enorme admiração pelo que ele falava e por ver a sua atuação na "Tropicália" – "mudando o Brasil", segundo o cantor. "Eu era um espectador disso, eu não era artista ainda", comenta.

Ao encontrar Caetano Veloso vestido de cor-de-rosa da cabeça aos pés numa sorveteria de Brasília, Ney não conseguiu ir falar com ele, mas pensou: "Se eu for artista um dia eu quero ser uma coisa assim!". Para ele, o fato de Caetano estar vestido inteiramente de rosa naquela época (final dos anos 60), traduzia uma transgressão que o cantor jamais havia visto. "Significou pra mim um salto no tempo e no espaço", conclui.

"O que tira o teu sono, Ney?", perguntou Sarah. "Trabalho. Trabalho é que tira o meu sono. Sempre foi assim, trabalho é que me deixa ligado". E revelou ainda não ser a pessoa festiva que pensam que ele é pela marca registrada do seu trabalho. "Eu sou muito mais reservado e observador do que festivo. No palco faço um personagem onde cabe até isso", declara.


A apresentadora comenta sobre uma foto do cantor ao lado de uma do compositor Cazuza (1958 - 1990) em um canto da sala do apartamento de Ney no Rio de Janeiro onde conversavam. "Eu estou na foto de braços abertos para ele (Cazuza). Em geral ninguém percebe, porque ninguém olha pra lá. Você foi a única pessoa que viu e percebeu. Você descobriu um segredo meu", revela o cantor que viveu um longo romance com Cazuza.

Ney relembra com visível carinho algumas concessões que fazia em sua relação com Cazuza que, segundo ele, era "da noite". "Eu não gosto de beber, não gosto de butiquim, não é a minha. A única época da minha vida que eu fui da noite foi com Cazuza. Eu concedia isso a ele – eu ia pra noite com ele", revela Ney.

"Ele (Cazuza) gostava disso e a gente queria estar juntos. Eu saía da minha e entrava na dele e a gente ia pra balada, pra todos os lugares, eu rodava com ele os butiquins. Eu tinha um enorme prazer de realizar isso com ele, porque eu sabia que ele gostava de estar comigo nesses lugares. E eu ia pra lugar barra pesada mesmo com ele!", relembra Ney.

Para falar em solidão, Ney reforça a letra de uma canção ("Pro Dia Nascer Feliz") do próprio Cazuza que o cantor gravou e que diz: "a solidão é pretensão de quem fica escondido fazendo fita" –"eu acho isso verdade", confirma. "Eu não tenho solidão. Eu vivo só e não sou solitário. Não tem sofrimento nenhum envolvido nisso. Eu não me sinto solitário, nem triste, nem abandonado no mundo. É uma opção minha, eu prefiro", afirma.

Encerrando o bate papo descontraído, Ney Matogrosso deixa clara a sua proposta através de uma afirmação contundente: "Não se satisfaçam com a minha liberdade, exercitem a de vocês", sugere o cantor da voz cristalina em tantas belas canções, imbatível na sua clássica interpretação de "Rosa de Hiroshima" (Vinicius de Moraes - 1973).

Renato Kramer

Natural de Porto Alegre, Renato Kramer formou-se em Estudos Sociais pela PUC/RS. Começou a fazer teatro ainda no sul. Em São Paulo, formou-se como ator na Escola de Arte Dramática (USP). Escreveu, dirigiu e atuou em diversos espetáculos teatrais. Já assinou a coluna "Antena", na "Contigo!", e fez críticas teatrais para o "Jornal da Tarde" e para a rádio Eldorado AM. Na Folha, colaborou com a "Ilustrada" antes de se tornar colunista do site "F5"

Final do conteúdo
  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Ver todos os comentários Comentar esta reportagem

Últimas Notícias