Renato Kramer

'Vox Populi' relembra entrevista com a comediante Consuelo Leandro

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"Eu estreei praticamente com 5 anos de idade numa procissão", declarou a saudosa comediante Consuelo Leandro (1932 - 1999) no arquivo "Vox Populi" (TV Cultura) que foi ao ar nesta terça-feira (3).

Grandes personagens que marcaram presença na televisão brasileira fizeram perguntas para a comediante talentosa em entrevista histórica de 1980. Importante homenagear artistas que tanto colaboraram com o entretenimento brasileiro como Consuelo, que ficara muito contrariada ao ser acusada de imitar Dercy Gonçalves por um crítico da época. "Ele é chamado de mestre. De quê eu não sei", comentou Leandro com certo desprezo, "o único mestre que eu conheço é Jesus Cristo!", concluiu acendendo um cigarro.

Consuelo acreditava que a sua vocação para o palco vinha desde a sua tenra infância. "Em Lorena (SP), usava muito as crianças saírem de anjo na procissão da Semana Santa. Eu era muito requisitada para ser o anjo. Uma vez eu obriguei a minha mãe a desmanchar um cinto de strass e fazer uma cruz bem grande. Eu ficava atrás do andor procurando as luzes e aquele reflexo do brilho me dava uma sensação de poder. Então eu acho que fui picada por um strass —e daí veio o meu gosto pelo brilho, pelo aplauso, por ser o centro das atenções", confessou a comediante.

Em seu primeiro teste para o então cultuado Teatro de Revista, no Rio de Janeiro, a atriz foi rejeitada pela cor da sua pele ser clara demais: "Ela é muito branquinha, no meio das garotas bronzeadas aqui de Copacabana não vai dar certo". Consuelo não gostou, ficou quieta, mas ao sair tacou o guarda-chuva na cabeça do amigo que insistira em levá-la para a seleção. Mais tarde tornou-se uma das grandes estrelas das revistas de Walter Pinto, assim como Mara Rúbia, Grande Otelo, Violeta Ferraz, Oscarito e Dercy Gonçalves, entre outros.

"Como foi a aceitação da sua família na sua entrada para o Teatro de Revista?", quis saber o apresentador. "Engrossou", respondeu Consuelo, "engrossou e eu fui posta para fora de casa. Meu avô disse que na casa dele não tinha lugar para 'mulher dama', prostituta! Aí eu fui embora", confidencia a comediante que fora criada num regime militar.

O Velho Guerreiro (Chacrinha) aparece para perguntar para Consuelo por que, "sendo uma das maiores comediantes do Brasil", ela andava tão afastada da telinha. "É porque você não quer a televisão ou a televisão ainda não 'se mancou' de dar o destaque que você merece, como você já teve no tempo da TV Rio?", quis saber Abelardo Barbosa. "Não sei, Chacrinha. Eu faço quando me convidam. Eu não vou bater na porta de ninguém para pedir emprego! Os camaradas me conhecem, conhecem o meu trabalho – se eles não me chamam é porque não estão interessados em mim!", retruca Leandro.

A apresentadora Hebe também faz a sua participação: "Amada Consuelo Leandro, eu estou preocupada com você – porque eu acho que uma coisa está ligada a outra: se a gente não está feliz sentimentalmente, a carreira da gente se vê muito atrapalhada. Eu estou preocupada porque sei que você é casada com um estrangeiro, então como é que vai ficar a sua situação, agora com essa lei tão esquisita do estrangeiro no Brasil que passou no Congresso. Você vai embora?", perguntou Hebe. "Se o meu marido for embora e quiser me levar, aí eu vou. Mas deixar o Brasil também eu não quero. Então, acho que vai ser cada um por si e Deus por todos!", concluiu Consuelo.

Na participação da colega Nair Belo é que Consuelo se emociona mais. "Todo o artista é um ser humano normal. Mas eu acho que nós comediantes somos seres especiais, porque a gente faz rir. Eu sempre achei que fazer rir é mais difícil do que fazer chorar. Qual foi a situação mais difícil que você teve que passar, quando num dia qualquer você estivesse muito triste e teve que fazer graça? Como é que você se sentiu?", perguntou Nair que havia perdido um filho. "Eu engravidei algumas vezes, mas perdi...aí nunca mais tive filhos e eu achei até que Deus sabia o que estava fazendo. E sabia mesmo, porque depois o meu irmão morreu e eu fiquei com minhas duas sobrinhas", conta Consuelo.

Ao ser questionada pela atriz Etty Fraser sobre o futuro do humor no Brasil, Consuelo solta: "Bom, se acabar o humor na televisão, tem as 'câmaras' aí! Você vai na Câmara dos Deputados, na Câmara dos Vereadores, você vai no Senado...mudam os atores, muda o texto, mas a comédia é a mesma!", afirma Consuelo Leandro que marcou época com a sua Cremilda, a esposa do 'marido Oscar que era podre de rico', em "A Praça É Nossa" (SBT).

Renato Kramer

Natural de Porto Alegre, Renato Kramer formou-se em Estudos Sociais pela PUC/RS. Começou a fazer teatro ainda no sul. Em São Paulo, formou-se como ator na Escola de Arte Dramática (USP). Escreveu, dirigiu e atuou em diversos espetáculos teatrais. Já assinou a coluna "Antena", na "Contigo!", e fez críticas teatrais para o "Jornal da Tarde" e para a rádio Eldorado AM. Na Folha, colaborou com a "Ilustrada" antes de se tornar colunista do site "F5"

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