O programa "Som Brasil" (Rede Globo) desta sexta-feira se propôs a homenagear as canções apresentadas no programa "Jovem Guarda" (TV Record), comandado pelo então jovem cantor Roberto Carlos.

"Jovem Guarda" estreou em agosto de 1965, e o cantor Roberto Carlos (24, na época) contava com o "Tremendão" Erasmo Carlos (24) e a "Ternurinha" Wanderléa (19) para auxiliá-lo a apresentar os cantores da música pop do momento. Tão grande foi a repercussão e o sucesso do programa que "Jovem Guarda" passou a ser considerada um movimento musical.

Grandes talentos passaram pelo palco do Teatro Record de onde era transmitido o programa no final da tarde dos domingos, e que teve o seu auge entre 1965 e 1968. Conjuntos vocais de primeira linha, como o Trio Esperança, Os Caçulas e os Golden Boys. Duplas como Os Vips e Deny e Dino. E um grande número de jovens cantores surgiria no cenário nacional, como Waldirene, Eduardo Araújo, Silvinha, Jerry Adriani, Martinha e Vanusa --entre tantos outros.

"Festa de Arromba" (Roberto e Erasmo Carlos), na interpretação de Erasmo Carlos, é uma canção que acabou se tornando uma espécie de resenha do que acontecia na "Jovem Guarda". "Canções usavam formas simples pra falar de amor, carrões e gente numa festa de sorriso e cor", diria Roberto Carlos na letra de "Jovens Tardes de Domingo", composta anos depois para falar das saudades que aquele momento tão especial lhe deixara.

Pois o "Som Brasil" não fez jus à "festa de arromba". "Arrombou a festa", como diria Rita Lee numa canção sua. Errou feio na escolha dos intérpretes para reviver as doces, românticas e, por vezes, ingênuas canções da Jovem Guarda.

Com todo o respeito que os artistas envolvidos merecem, mas o que tem a ver o estilo da banda Calypso com "as canções que ele (Roberto) fez pra nós"?! Por que cargas d'água não avisaram aos jovens da banda Restart que as canções da Jovem Guarda eram simples mas tinham "alma"? E o que dizer da frieza mórbida com que o trio Stop Play Moon interpretou a animada "Rua Augusta", de Ronnie Cord, e a apaixonada "Eu Daria a Minha Vida", de Martinha?!

Releituras? Sinto muito. Não funcionou. Quem se saiu bem foi Marcelo Jeneci, na sua versão suave de "Gatinha Manhosa" (Roberto e Erasmo Carlos) e, especialmente, ao receber os três ótimos remanescentes dos Golden Boys para interpretar "Alguém na Multidão" (Rossini Pinto), que deram um toque de classe ao programa.

Valeu pela presença do cantor Jerry Adriani, embora ao juntar-se à banda Restart para cantar o seu sucesso "Doce, Doce Amor" (Raul Seixas), sua voz de tão poderosa nem cabia no arranjo do grupo.

Mas valeu mesmo, principalmente, pela presença sempre exuberante da cantora Wanderléa. Generosa, não se incomodou de entrar no palco para dividir com Joelma dois de seus maiores sucessos da época: "Prova de Fogo" (Erasmo Carlos - 1967) e "Pare o Casamento" (Resnick/ Young - versão Luis Keller - 1966). Às vésperas de completar 66 anos, a "Rainha da Jovem Guarda" deu um show de graça, alegria e jovialidade --mostrando porque fora eleita "rainha" e nunca perdera a majestade, com o mesmo carisma que a consagrou como a maior estrela pop do Brasil.

No final surge um clipe antigo, onde Roberto Carlos canta "Jovens Tardes de Domingo" junto com Wanderléa, Erasmo e muitos outros cantores da Jovem Guarda. O "Rei" só mesmo em vídeo. Se ele estivesse lá, sem dúvida ia ensinar direitinho para aquela turma como é que "a banda toca"! Aí sim, ele e a Ternurinha mostrariam a todos como eram de verdade as "jovens tardes de domingo, tantas alegrias...belos tempos, belos dias".

Renato Kramer

Natural de Porto Alegre, Renato Kramer formou-se em Estudos Sociais pela PUC/RS. Começou a fazer teatro ainda no sul. Em São Paulo, formou-se como ator na Escola de Arte Dramática (USP). Escreveu, dirigiu e atuou em diversos espetáculos teatrais. Já assinou a coluna "Antena", na "Contigo!", e fez críticas teatrais para o "Jornal da Tarde" e para a rádio Eldorado AM. Na Folha, colaborou com a "Ilustrada" antes de se tornar colunista do site "F5"