Celebridades

Novo "Batman" é a adaptação mais corajosa de um gibi para o cinema

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Se "Batman - O Cavaleiro das Trevas" mostrou que uma adaptação de quadrinhos para o cinema não precisa seguir as fórmulas hollywoodianas de sempre, sua continuação destrói de vez qualquer clichê do gênero (cuidado, há spoilers do filme adiante).

"Batman - O Cavaleiro das Trevas Ressurge", terceiro capítulo da saga iniciada com "Batman Begins" (2005), é a adaptação de gibi mais corajosa de todos os tempos. Para começo de conversa, dura 2h45, diminuindo o número de sessões diárias e, consequentemente, o lucro do fim de semana.

O procedimento padrão para uma franquia que já rendeu perto dos US$ 2 bilhões seria lançar um longa de menos de duas horas para produzir números impressionantes (ou enganadores) e render manchetes do tipo "Novo Batman bate recordes de bilheteria."

Mas isso nunca foi o objetivo do diretor Christopher Nolan quando ele foi chamado para recuperar o personagem maltratado nos extravagantes e risíveis "Batman Eternamente" e "Batman & Robin".

Em "Batman Begins", o inglês ousou jogar Batman em um mundo realista, dando tanta importância à sua identidade secreta, o playboy Bruce Wayne (Christian Bale), quanto aos gadgets usados pelo herói.

É o que nos leva à segunda decisão mais corajosa de "Batman - O Cavaleiro das Trevas Ressurge". Nolan ousa ao dirigir um filme do Batman, sem o Batman. Ele potencializa os temas de "Batman Begins" sobre terrorismo e ideologias radicais, dedica-se ao homem por trás da máscara e termina o ciclo de forma perfeita.

Obviamente que há adaptações tão complexas e violentas quanto "O Cavaleiro das Trevas Ressurge", mas todas elas já trazem essa bagagem do material original --caso de "Kick Ass" (2010), "Estrada para Perdição" (2002) ou "Ghost World" (2001).

Crédito: Divulgação Christian Bale (foto) em seu "Bat Pod" no filme "Batman: O Cavaleiro das Trevas Ressurge"
Christian Bale (foto) em seu "Bat Pod" no filme "Batman: O Cavaleiro das Trevas Ressurge"

Não é o caso de "Batman - O Cavaleiro das Trevas Ressurge". O roteiro original de Nolan e de seu irmão, Jonathan, pinça um vilão medíocre das HQs e o transforma em uma assustadora força da natureza com propósito de reflexo real. Bane (Tom Hardy, cada vez mais especializado em papéis que exigem um físico absurdo) não é um supervilão alimentado por uma droga que aumenta sua força, como nas HQs.

Ele é um ex-membro da Liga dos Assassinos, a mesma que treinou Bruce Wayne e era liderada por Ra's Al Ghul (Liam Neeson), e um terrorista com ideais populistas ­--a máscara que cobre seu rosto libera um gás analgésico para o "vilão" suportar um trauma violento do passado.

Em determinado momento, Bane arma um plano para transformar Gotham em um exemplo para o mundo, invocando frases como "o poder para o povo", "políticos corruptos e elite sanguessuga" e roubando o prédio da bolsa. Bane é a revolta popular contra a crise, mas seria a saída correta?

Nolan diz que as ideias de lutas de classes do roteiro vêm de "Um Conto de Duas Cidades", de Charles Dickens. Mas não há como deixar a parábola de lado com o que acontece no mundo de lado de cá dos livros nos últimos três anos. O poder do povo derrubou um ditador no Egito, mas os novos governantes são tão criticados pelo povo quanto o anteriores. Occupy Wall Street perde participação popular contra banqueiros.

Provocar o espectador ao ponto de questionar revoltas populares é o centro nervoso do longa. E como inserir o Batman nesta equação? A resposta de Nolan foi ainda mais descabida: ele simplesmente deixa o herói de lado e aposta nos personagens secundários.

Wayne já começa o filme com um estado físico de dar inveja a Gregory House, o médico manco de "House". Oito anos se passaram desde que o herói assumiu o assassinato do promotor Harvey Dent (Aaron Eckhart) para proteger os ideais éticos do morto. O encapuzado nunca mais foi visto e é procurado pela polícia de Gotham, apesar do comissário Gordon (Gary Oldman) saber toda a verdade sobre o caso.

Crédito: Divulgação Anne Hathaway como a Mulher-Gato em cena de "Batman - O Cavaleiro das Trevas Ressurge"
Anne Hathaway como a Mulher-Gato em cena de "Batman - O Cavaleiro das Trevas Ressurge"

Quando Selina Kyle (Anne Hathaway), uma famosa ladra, tenta roubar o colar de pérolas que pertencia a matriarca dos Wayne, o herói reencontra a faísca que faltava para voltar às ruas. Mas é tarde demais: Bane prepara um esquema que coloca Gotham inteira a seus pés e leva Batman a seu encontro no que é a luta mais brutal de gibi no cinema.

Entram em cena o policial vivido por Joseph Gordon-Levitt ("A Origem"), Gordon e a própria Selina Kyle. Os três procuram proteger o verdadeiro cidadão de Gotham contra seu novo "ditador", organizando milícias e resistências. Neste momento, "O Cavaleiro das Trevas Ressurge" vira um filme de guerrilha urbana, mais conectado com "A Batalha de Argel" (1966) ou "Falcão Negro em Perigo" (2001).

Nolan faz seu terceiro Batman ter uma conclusão épica e até chocante. Não chega a ser superior ao anterior "Cavaleiro das Trevas", não tem tantas cenas de ação de cair o queixo, mas é tão íntegro quanto. Sua maior arma? A liberdade (gerada pelo sucesso de suas produções, claro) para não tratar o personagem como um ícone para vender brinquedos.

O "Batman" de Christopher Nolan vai ficar na história como uma das maiores trilogias do cinema, e não apenas do gênero de super-herói. Afinal, "O Cavaleiro das Trevas Ressurge" é tudo, menos um filme de herói.

O jornalista Rodrigo Salem viajou a convite da Warner Bros.

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